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Atualizado: 08 de fevereiro de 2007

 

 

 

XII Encontro Nacional de Filosofia da ANPOF

XI Encontro Nacional de Filosofia da ANPOF

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Trabalhos Inscritos no XII ENCONTRO NACIONAL DE FILOSOFIA DA ANPOF,

Salvador, Bahia, 23 a 27 de outubro de 2006

 

 

1) Agemir Bavaresco; Sérgio B. Christino - Reconhecimento intersubjetivo no viés jusfilosófico de Hegel e Kojève

 

O reconhecimento é um dos conceitos éticos mais importantes, dentre aqueles que podem ser identificados, por exemplo, no passado, pós Segunda Guerra, como uma série de lutas no sentido dos movimentos nacionais de liberação, por direitos civis, pela emancipação das mulheres ou das múltiplas lutas por identidades culturais. Hoje, diante do acentuado nível de exclusão social, da redefinição de nacionalidades e de blocos regionais, busca-se, novamente, a aplicação da teoria do reconhecimento, de modo a possibilitar uma intersubjetividade entre os sujeitos políticos internacionais, respeitando-se as diferenças e identidades e garantindo-se relações justas sob o ponto de vista sócio-econômico e cultural. O tema do reconhecimento na obra de G. W. F. Hegel é central. Há uma dupla possibilidade hermenêutica: De um lado, situa-se, classicamente, este tema na figura da luta entre o senhor e o escravo na Fenomenologia do Espírito; de outro, estuda-se esta figura na Enciclopédia. A intersubjetividade e, portanto, o reconhecimento, na obra hegeliana, coloca o problema: Como é possível construir uma interpretação que supere o conceito de subjetividade moderna, positivado pela prática jusfilosófica, garantindo um novo paradigma, fundado na intersubjetividade, portanto, pressupondo a teoria hegeliana do reconhecimento? Em primeiro lugar, mostra-se em Hegel a teoria do reconhecimento e seu desenvolvimento. Depois, analisa-se o desejo antropológico de reconhecimento como fonte da idéia de justiça em A. Kojève. Em seguida, apresenta-se a fenomenologia da justiça, segundo o mesmo autor, que parte do princípio que o desejo, conforme Hegel, quer o reconhecimento, sendo este a fonte última da idéia de justiça. Kojève expõe, fenomenologicamente, a idéia de justiça em três momentos: a justiça aristocrática ou a igualdade, a justiça burguesa ou a equivalência e a justiça cidadã ou a eqüidade.Enfim, a análise fenomenológica, feita por Kojève, mostra que a idéia de justiça evolui, segundo uma lógica do reconhecimento simétrico entre deveres e direitos, entre universal e particular. O universalismo do direito aristocrático e o particularismo (ou o individualismo) do direito burguês coincidirão, pois os direitos e os deveres os mais pessoais, exercidos pelo indivíduo, serão os direitos e deveres os mais universais, isto é, aqueles do cidadão tomado como cidadão ou aqueles de todos e de cada um. Enfim, conclui-se que o reconhecimento intersubjetivo dá-se em vários níveis de mediação sócio-jurídico-política. Assim, produzir na complexidade da sociedade mundializada uma hermenêutica jusfilosófica de viés intersubjetivo encontra na teoria do reconhecimento hegeliano um pressuposto epistemológico fundamental. 

 

 

2) Alfredo de Oliveira Moraes - O "Saber Absoluto": Se é possível alcançá-lo é possível vivê-lo?

 

Difícil não é alcançar uma nova verdade, difícil é encontrar os meios de realizá-la.Essa constatação inicial, tomada em paráfrase de L. Munford, talvez nos sirva de consolação e ao mesmo tempo nos anime a enfrentar o desafio do legado hegeliano. Diante da rudeza chocante das verdades do sistema hegeliano muitos optaram por, no dizer de Bernard Bourgeois, ultrapassá-lo sem passar ou enfrentar-se a ele e, outros, deixaram-se levar pelo desespero e do tremor passaram ao temor bradando pela impossibilidade de encontrar lugar para a existência humana num mundo perpassado por esse saber. Aqui o ponto a partir do qual iremos desenvolver nossa reflexão, com a intenção explícita de propiciar, a mim mesmo e a quem ouvindo também se atreva, um ponto de inflexão existencial motivado pela mudança na direção do olhar que o texto hegeliano pode nos permitir quando penetrado até o silêncio entre as palavras. O “Saber Absoluto” é, por assim dizer, o último degrau da escada que conduz a Consciência-de-si a elevar-se à Ciência. Mas, não constitui nossa intenção, para o momento, exercitar-nos numa reflexão epistemológica afeita aos limites do saber, nossa intenção é indagar a existência e fazer isso no alcance da verdade do “Saber Absoluto”; para tal faremos inicialmente um périplo no interior desse saber para só então efetivarmos nossa passagem às suas implicações na dinâmica da existência humana. São muitas as inquietações que o novo milênio da era cristã recebeu amplificadas do século que há pouco findou, talvez pela excessiva insistência analítico-formal-positivista que dominou a cena da civilização do ocidente em seu expansionismo, sobretudo, no pós II Guerra Mundial, citando apenas as que nos parecem fundamentais à reflexão que nos dispomos: o sentido da existência e dentro dele a dimensão ética, as fragilidades de uma história governada pela Idéia de Razão (ainda pouco compreendida) e realizada por sujeitos atomizados e descentrados de si-mesmos, as relações de alteridade experienciadas nas adversidades da diversidade cultural e nas desigualdades sócio-econômicas intensificadas por exercícios hegemônicos de poder. No âmbito desse panorama a reflexão filosófica do século passado parece ter se esmerado em permanecer como uma ‘consciência infeliz’ que se compraz em constatar a verdade da sua situação de cisão interior e se perde em detalhes amiúdes de significância questionável, perdem tempo edificando ‘castelos lógicos’ que se desmancham no menor contato com a realidade efetiva, à qual tentam impor camisas-de-força intelectuais, cujas conseqüências têm sido, entre outras: a cegueira dialética, a sustentação política de hegemonias nefastas e a perda de referenciais pelo abandono da Metafísica. O filósofo é homem de seu tempo, é desse tempo e desse mundo que iremos no ocupar nessa reflexão.

 

 

3) Arnaldo Fortes Drummond - Hegel: Liberdade e Economia na Sociedade Civil

 

Nos Princípios da filosofia do direito, Hegel formulou de maneira precursora e insuperável uma Teoria de Estado que refuta cabalmente a Teoria Liberal de Estado porque ultrapassa o paradigma de liberdade em que as teorias liberais são fundamentadas – o paradigma da liberdade de escolha ou do livre-arbítrio. Através deste paradigma, Hegel trata de maneira integrada os temas econômico, político e do direito de uma nova ordem social verdadeiramente humanista. E na parte em que trata a sociedade civil §§ 182-256 (2ª Seção; 3ª parte: A eticidade) ficam caracterizados os limites intransponíveis para o exercício da eticidade e, conseqüentemente, de uma combinação real entre ética e economia numa sociedade organizada sob o primado da liberdade de mercado. Pois, a liberdade que se evoca ao mercado para servir de fundamento humanista à teoria econômica burguesa não é a liberdade como Hegel demonstrou. Antes, nenhum saber tinha tomado a liberdade como único procedimento gnosiológico reservado à filosofia e, pois, núcleo de um sistema conceptual cuja característica, na denominação hegeliana, é de um saber especulativo. Por isso, a liberdade é o núcleo espiritual onde germina toda racionalidade ética. E a sociedade civil é apenas um momento de passagem na construção das relações sociais em que, entretanto, predominam interesses individuais, reduzindo o exercício da autonomia da liberdade ao limitado interesse particular previsto no mundo empírico e finito das possibilidades de escolha que, falsamente, se traduz por liberdade. Daí, conforme o diagnóstico precursor de Hegel, a confusão permanente ao Estado liberal entre direito público e direito privado. Ao invés de ordem pública, o Estado liberal prioriza a ordem do interesse particular própria à natureza privada da sociedade civil e torna-se, por assim dizer, um anti-Estado que sucumbe na dinâmica da sociedade civil. E a liberdade prevista no exercício infinito de autonomia também se confunde com a anti-liberdade de mercado porque está pré-determinada pelo universo finito de possibilidades de escolha. Analisar a crítica hegeliana à acepção liberal de liberdade é compreender a limitada condição racional e livre no interior da sociedade civil onde o princípio da liberdade de mercado prevalece na organização econômica capitalista. É o que se pretende em nossa comunicação.

 

 

4) Cesar Augusto Ramos - Hegel, o Liberalismo e o Republicanismo

 

O modelo político da tradição liberal representou uma tendência hegemônica na filosofia política ao defender temas cruciais para a vida social na modernidade: a valorização do indivíduo e da sua liberdade, definida como a esfera do livre agir (ausência de impedimentos externos indevidos) que se orienta pelo paradigma jurídico dos direitos individuais; a cidadania concebida como um valor instrumental para a defesa desses direitos; a limitação do Estado e a legitimidade do poder político subordinado aos interesses da sociedade civil; e a importância do pluralismo associado a uma concepção política de justiça.
Sem recorrer a qualquer bem de fundo ético, o liberalismo defende tão somente a coação do regramento jurídico da vida e das relações sociais que determina os limites da liberdade individual, protege os direitos, e define o alcance do poder político. Uma vez que o ponto de partida é a liberdade individual, a finalidade do viver social não é mais a fruição política da cidadania na dimensão pública, mas a autonomia dos sujeitos na esfera privada da sociedade. O inevitável processo de “despolitização” desta sociedade e dos conflitos sociais é decorrência da ênfase a uma política atrelada à garantia da pessoa com privilégios e imunidades.
Uma outra leitura da filosofia política moderna, de inspiração republicana, procurou mostrar que ela não se esgota na forma hegemônica de sua compreensão segundo o paradigma jurídico do liberalismo. O republicanismo cívico de inspiração clássica, e presente no chamado humanismo cívico que remonta ao ideal aristotélico do homem como animal político e à res publica romana, ressurge na modernidade com destaque a Maquiavel.
Diante das insuficiências da concepção liberal e do modelo jurídico-liberal da liberdade negativa, o republicanismo cívico busca uma compreensão mais ampla da liberdade (política) que se define como não-dominação e orienta-se pelo modelo das virtudes cívicas da cidadania. Para tanto, ela deve implicar: a) a dimensão social do viver político do homem; b) o reconhecimento da legitimidade do direito e da igualdade de todos; c) a idéia da comunidade política como autogoverno dos cidadãos na criação de leis que efetivam a liberdade sem emascular a realidade do conflito; e d) a atuação política do cidadão pela prática de virtudes políticas.
Essas teses republicanas não estão distantes da filosofia política de Hegel, sobretudo, no que diz respeito ao conceito de liberdade como princípio do auto-governo racional (estar-consigo-mesmo). O nosso objetivo consiste, portanto, em investigar a presença ambígua e difusa (de superação e conservação e mesmo de reconciliação) tanto do liberalismo como do republicanismo cívico na filosofia política de Hegel. Pretende-se, também, mostrar que esse distanciamento crítico deve-se, em parte, à incorporação na sua filosofia política do conceito do reconhecimento, a partir do qual o pressuposto da liberdade individual se efetiva numa esfera da sociabilidade inter-subjetiva que, tendo por base o princípio republicano da liberdade como não-dominação, torna-a efetiva apenas pela ação do mútuo reconhecimento dos agentes sociais nas diferentes esferas daquilo que Hegel chamou de Sittlichkeit.

 

 

5) Danilo Vaz Curado Ribeiro de Menezes Costa - Dialética e justificação da Filosofia nos § 2 a 8 do Vorrede da Phänomenologie des Geistes de G.W.F Hegel

 

A filosofia na atualidade vive um tempo semelhante ao da elaboração da Phänomenologie des Geistes, um momento de cisão entre forma e conteúdo, de tensa perda de referência ao real. É um lugar comum na historiografia filosófica a citação hegeliana de que a filosofia deve traduzir o tempo em conceito; porém, em que pese à repetição quase exaustiva desta idéia motora do pensar de Hegel, pouco se tem produzido acerca das implicações desta axial assertiva – o que vale não apenas para o pensar hegeliano, mas, para todo o conjunto da tradição filosófica ocidental. Partiremos da premissa que filosofia e dialética são elementos auto-pressuponentes, os quais, especialmente no Prefácio (Vorrede) da Fenomenologia do Espírito (Phänomenologie des Geistes) de 1807, nos parágrafos de 2 a 8, Hegel problematiza à luz de um debate com a tradição, no sentido de apresentar a filosofia como sistema, a dialética como método justificando assim a filosofia enquanto auto-exposicão dialética do saber efetivo num sistema filosófico. Verificaremos à luz dos passos trilhados nos parágrafos indicados do Vorrede como se estrutura o encadeamento da relação entre a necessidade da justificação da filosofia como sistema e da dialética como seu elemento vivificador e determinante. Reconstruiremos a relação de justificação da filosofia e dialética através da problematização interna aos parágrafos de 2 a 8, verificando pari passu como Hegel elabora uma crítica ao senso comum e à sua percepção analítica do pensar em oposição a sua compreensão de filosofia como atualização ou exposição de si-mesma em seu devir (§3º); da necessidade da filosofia atingir o status de cientificidade em oposição às tendências intuitivas, edificantes (§5º) de apreensão imediata do absoluto tão comuns em sua época, especialmente nos círculos românticos. Buscar-se-á demonstrar como, para Hegel no Vorrede da Phänomenologie des Geistes, a filosofia justifica-se à medida que dialeticamente constrói-se como sistema suprassumindo a dicotomia entre o sensível e o racional (§7º), através do recurso ao pensar especulativo (§8º), pois, para Hegel, a filosofia deve deixar de ser amor ao saber para ser saber efetivo. A título de conclusão, mostraremos que Hegel apresenta a Filosofia como justificando-se a si-mesma numa auto-exposição dialética, onde a mesma apresenta-se como o desvelamento do real à luz da efetivação sistemática do universal concreto, onde razão é autoconhecimento de si-mesma.

 

 

6) Draiton Gonzaga de Souza - A “ruptura” de Feuerbach com a filosofia especulativa

 

No presente trabalho, situarei a crítica da religião de Feuebach no contexto de sua ruptura com a filosofia especulativa, sobretudo com a de Hegel. Feuerbach descreve seu distanciamento da filosofia clássica alemã como uma “ruptura com a especulação” – e essa expressão é, no mínimo, ambígua: ao mesmo tempo em que revela algo sobre esse processo, também o encobre. Por um lado, a “ruptura” com algo não sinifica o “colapso” daquilo com que se rompe – a ruptura com a especulação, portanto, não significa o colapso do idealismo alemão. Além disso, “ruptura” não pressupõe necessariamente “crítica”, e muito menos uma crítica procedente. A crítica feuerbachiana ao idealismo consiste em denunciar a filosofia especulativa como um resíduo da teologia. Porém, com a transformação de Deus na razão permanece ainda a questão de Deus, e, assim, a filosofia especulativa como um todo poderia ser considerada teologia especulativa. O próprio Feuerbach teve de experienciar a arbitrariedade de uma crítica desse tipo, pois essa figura argumentativa – expressa pelo “nada mais é do que” – pode ser repetida indefinidamente, e assim a iteração da suspeita teológica dirigir-se-á, posteriormente, contra a posição que Feuerbach queria fundamentar mediante o desmascaramento da suposta origem divina da razão. Engels, por exemplo, afirmará que o “ser humano” feuerbachiano é derivado de Deus. Com isso, o conceito de “ser humano”, que deveria suceder aos conceitos de Deus e de razão, terá rapidamente o mesmo destino que o de razão.

 

 

7) Erick Calheiros de Lima - Socialização e individualização: questões acerca da atualidade do conceito hegeliano de reconhecimento (não compareceu para apresentar a comunicação)

 

Evidenciando enorme atualidade, a teoria hegeliana da mediação intersubjetiva da autoconsciência tem sido bastante resgatada em discussões recentes: para além de sua influente interpretação centrada no “estágio fenomenológico” da relação senhor/escravo (Kojève, 1947), a concepção hegeliana da interação (Habermas 1968, 2004) se faz atualmente presente na “filosofia social”, seja como preâmbulo para a mediação do debate entre comunitarismo e liberalismo (Forst 1994, Honneth 2004, Williams 2002), seja na tentativa de contextualização social de princípios da justiça constituídos formalmente (Honneth 2001), ou na transformação da filosofia prática em teoria normativa das instituições e condições de socialização (Siep 1976, 2004), ou ainda como prelúdio para a integração pós-metafísica da moral kantiana e da concepção ético-política aristotélica (Honneth 2000). Pela conexão do desenvolvimento conflituoso dos níveis sócio-institucionais de intersubjetividade com a experiência moral da não efetivação do teor normativo do reconhecimento, compreendida como “dinâmica social do desrespeito (Missachtung)”, o modelo hegeliano tem se vinculado ainda a uma reorientação da “teoria crítica” pela ampliação do teor normativo do paradigma habermasiano de comunicação para além da pragmática universal (Honneth 2000). Entretanto, sua atualidade cria ensejo para uma consideração, ainda em Hegel, de sua conexão com processos de socialização e individualização nas instituições da “eticidade moderna” que se vinculam à possibilidade de uma harmonização não unilateral de identidade e diferença. Seu cerne normativo residiria, assim, na mediação não reducionista e no desenvolvimento dinâmico destes processos (Habermas 1988). Pretende-se examinar, à luz de interpretações desta conexão (Habermas, Honneth, Ilting, Siep, Wildt, Williams), a plausibilidade da tese de que o projeto de 1803/04 de mediação da individualidade e da universalidade em diferentes níveis de relações intersubjetivas (Honneth 1992) e de explicação do desenvolvimento de formas éticas da universalidade e da autoconsciência pelo reconhecimento recíproco, degenera-se, a partir de 1805/06, pela integração destes níveis ao retorno a si do espírito absoluto. Assim, evidências da mediação intersubjetiva de individualização e socialização pressuporiam a concepção do absoluto segundo o modelo monológico da auto-referência subjetiva (Habermas 1985). Por conseguinte, a derrocada do potencial intersubjetivo do conceito “jenense” de espírito face aos ditames lógico-especulativos promoveria a absorção da formação intersubjetiva da consciência ético-universal pela universalidade substancial-objetiva (Honneth 1992). Entretanto, ter-se-ia de considerar o apelo hegeliano a um conceito de eticidade institucional (1820) que, apesar da ênfase na auto-reflexividade do espírito livre e na efetivação da singularidade conceitual da idéia liberdade na “personalidade do estado”, permite, no desenvolvimento da eticidade, conceber níveis de reconhecimento e de constituição da individualidade que se coadunam com uma teoria normativa da socialização. Isto conduz à discussão da tese da verdrängte Intersubjektivität (Theunissen 1982), segundo a qual, através do processo de “substancialização” do espírito objetivo e da mediação plenamente acabada entre subjetividade e objetividade, Hegel “reprime”, pelo privilégio da relação da “atividade formal do singular” à substância ética, a idéia de uma constituição intersubjetiva e inacabada da “consciência universal”.

 

8) José Crisóstomo de Souza - Racionalidade, Intersubjetividade, Contexto: Richard Rorty, Jürgen Habermas e o Hegelianismo

Faço aqui uma introdução interpretativa ao debate Rorty-Habermas, apontando para a progressiva convergência e remanescente diferença entre suas respectivas posições filosóficas, e salientando seu bakground e o horizonte para o qual tendem. O debate compreende os materiais do encontro de Varsóvia, publicados como Debating the State of Philosophy (1996), e seu desenvolvimento posterior nas páginas de Rorty and His Critics (2000). Esses textos, e mais outros correlatos, aparecem em português no recém lançado volume, Filosofia, Racionalidade, Democracia (Ed. Unesp, 2005), organizado por mim. Em jogo, estão questões como a racionalidade, o fundacionismo e o relativismo, com relação ao nosso conhecimento e aos idéias éticos e políticos do Esclarecimento e da Modernidade. Ou seja, com relação à democracia, ao progresso social, à cultura emancipada e à auto-criação pessoal. Em torno daquelas questões de fundo, Rorty e Habermas trocam argumentos sobre anti-platonismo, contextualismo, dualismo, relativismo, historicismo, etc., preocupados em encontrar para a filosofia uma posição solidária com o “mundo da vida”. A convergência filosófica dos dois relativamente áquelas questões dá-se no que pode ser considerado um pragmatismo (no caso de Rorty, um neo-pragmatismo; no de Habermas, um pragmatismo kantiano) e na assimilação de algumas lições do hegelianismo: o contextualismo, a dimensão da história, da comunidade, da inter-subjetividade. Rorty, naturalmente, provém da tradição anglo-saxônica, do empirismo, de Hume e de Stuart Mill, além do positivismo lógico, da filosofia analítica e de sua virada lingüística. Com a relativa auto-dissolução (que ele considera hegelianizante) do projeto original da filosofia analítica, da qual participa e a qual promove, e com o acréscimo ou resgate de certos elementos românticos, Rorty faz-se, então, em seguida, herdeiro de John Dewey e de William James, em diálogo receptivo com Nietzsche e Heidegger.
Quanto a Habermas, ele é o grande herdeiro da filosofia clássica e do esclarecimento alemães, de Kant e de Hegel, e de seu broto contemporâneo: a filosofia da práxis, o marxismo ocidental. Mas avança cada vez mais na incorporação do aporte do pragmatismo norte-americano, de Peirce, Mead, Dewey, sem abrir mão de um elemento kantiano (que, entretanto, já parece, a Karl-Oto Apel, por demais diminuído), e, naturalmente, também de um componente hegeliano. Nisso tudo ele vê – e comprova – uma convergência que se apoiaria de fato num background comum, já que o pragmatismo nasce de um cruzamento do pensamento anglo-saxônico com a filosofia clássica alemã. Em particular, o pensamento de Dewey aparece como um jovem hegelianismo democrático e como um hegelianismo naturalizado, avesso aos dualismos do pensamento moderno clássico. Essa é também a visão de Rorty, que cobra apenas que Habermas abra mão do traço transcendental que ele luta por preservar.

 

9)  José Pinheiro Pertille - O conceito Vermögen na Introdução da Filosofia do Direito de Hegel

Na língua alemã, o substantivo Vermögen possui dois sentidos diferentes: o primeiro é o de “faculdade, poder, capacidade”, assim como aparece nas definições de pensamento e de vontade enquanto as duas “faculdades” da alma humana; o segundo é o de “riqueza, fortuna, bens”, como quando se fala das “riquezas” produzidas pela sociedade. O emprego teórico dos sentidos diversos deste conceito aparece, separadamente, nas doutrinas da psicologia (racional ou empírica) e da economia política. Hegel apropria-se dessas duas conotações, mas, como se observa na evolução de sua filosofia, particularmente em suas Lições sobre a Filosofia do Direito, ele passa a se valer daquela ambigüidade para mostrar como a verdade das faculdades da alma está em sua expressão na objetividade social, ao mesmo tempo em que a produção das riquezas vincula-se essencialmente às potencialidades subjetivas. Com base nessa constatação, foi possível afirmar que o torneamento hegeliano do duplo sentido daquele conceito revela um aspecto fundamental na articulação promovida por seu sistema entre o espírito subjetivo e o espírito objetivo (cf. nossa tese de doutorado intitulada “Faculdade do Espírito e Riqueza Material: Face e Verso do Conceito Vermögen na Filosofia de Hegel”). Trata-se agora de ampliar esse viés através do exame do conceito Vermögen na Introdução da Filosofia do Direito, à luz da importância estratégica que esse texto possui na constituição do sistema hegeliano como um todo. A questão principal é verificar até que ponto essa via de análise conduz aos mesmos resultados do conceito de Idee (idéia) tal como desenvolvido na Ciência da Lógica.

 

10) Manuel Moreira da Silva - Conceito e Êxtase no Prefácio à Fenomenologia do Espírito de Hegel: Monismo, Não-dualismo ou Filosofia especulativa?

Trata-se de uma consideração imanente em torno dos §§ iniciais do Prefácio à Fenomenologia do Espírito de Hegel, em especial dos §§ 3, 4 e 7. Pretende-se aí mostrar em que medida o Especulativo se faz necessário; no caso, em seu desenvolvimento fenomenológico, tanto para o retorno do Espírito adentro de Si quanto para o ordenamento das diversas figuras em que o mesmo se põe em Devir ou aparece a Si enquanto Ser-consciente. Trata-se, de modo mais específico, de se repensar o Especulativo e o lugar da Filosofia especulativa propriamente dita frente ao confronto das filosofias do Entusiasmo e do Saber imediato com a Filosofia transcendental em torno de um conhecimento efetivo acerca do Absoluto; isso, a partir da dilaceração kantiana da Razão e da Sensibilidade, bem como do Ético e do Belo sensível, resultante da oposição imutável do Conceito vazio e da Natureza, ou do Finito e do Infinito, passando pelas tentativas de reconciliação iniciadas por Schiller e Jacobi e finalizando com as posturas de Schleiermacher e Schlegel. Discutiremos inicialmente os limites e as unilateralidades constatadas por Hegel nas filosofias do Entusiasmo e do Saber imediato – sobretudo a redução da Razão à Sensibilidade ou do Ético ao Belo sensível e, fundamentalmente, do Infinito ao Finito; com o que tentaremos precisar as razões da recusa do Conceito vazio (kantiano) por essas posturas e, com isso, da reclusão das mesmas no Êxtase (por sua vez reduzido ao sensível e ao psicológico da Fé individual) tomado como ponto de vista fundamental para a apreensão e a expressão do Absoluto. Depois disso, discutiremos a postura hegeliana e sua tematização da exigência da expressão do Absoluto segundo os momentos de seu desenvolvimento imanente nos quadros do Ser-autoconsciente do Espírito; isso, no âmbito da dilaceração levada a cabo pela filosofia crítica e da resignação frente à mesma, na qual, não obstante, permanecem as filosofias do Entusiasmo e do Saber imediato, no que diz respeito ao Saber humano acerca do Absoluto e ao contentamento dessas filosofias com uma simples unidade imediata – meramente individual e subjetiva – com o mesmo. Enfim, para além da mera oposição do Conceito vazio (kantiano) e do Êxtase sentimentalista (do Entusiasmo e do Saber imediato) – situando-nos no próprio Saber absoluto – discutiremos o caráter propriamente especulativo puro da postura hegeliana em confrontando-a com as filosofias chamadas monistas (por exemplo, as de Espinosa e Parmênides) e as não-dualistas (como as de Shankara e Plotino); isso, sobretudo no tocante à identificação que se tem feito entre Monismo e Não-Dualismo na Filosofia e na Tradição espiritual em seus desenvolvimentos mais recentes, tanto em suas tentativas insuficientes de resolução do problema do dualismo quanto em seu confronto unilateral com o Dualiismo tomado como postura filosófica. A título de conclusão, explicitaremos o elemento característico do Especulativo puro; o que, ao mesmo tempo, o distingue das posturas acima aludidas e nele as integra como momentos de seu automovimento: o Conceito especulativo, o que é livre ou determinado em si e para si.

 

11) Marcia Zebina Araujo da Silva - A autoconsciência e a Vida do Espírito

É indiscutível o valor da Fenomenologia do Espírito e da Ciência da Lógica para a compreensão do pensamento de Hegel, contudo, a relação entre ambas, ou entre os intérpretes de Hegel que privilegiam uma ou outra, está longe de oferecer um consenso acerca do valor e do significado das mesmas na estruturação do sistema. Não pretendemos resolver a questão, mas tão somente aguçar o debate, estabelecendo uma relação entre estas duas obras pelo viés da “autoconsciência”. O 'Eu penso' é o ponto fulcral da modernidade filosófica alemã e Hegel pretende mostrar o seu sentido verdadeiro por intermédio do percurso da consciência fenomenológica. Contudo, este tema também é desenvolvido na Ciência da Lógica, em uma perspectiva distinta, em que a subjetividade do conceito não pode ser confundida com a consciência. É sobre o cruzamento da Lógica com a Fenomenologia em torno do tema da autoconsciência que pretendemos desenvolver alguns pontos de debate, mostrando as diferenças e semelhanças que aparecem nas duas obras e relacionando o seu desenvolvimento à vida do espírito.

12) Marcos Lutz Muller - Liberdade de Arbítrio e Liberdade Positiva

Pretende-se examinar os argumentos apresentados por Hegel na Introdução à Filosofia do Direito e nos parágrafos finais da Filosofia do Espírito Subjetivo, da Enciclopédia das Ciências Filosóficas (1830) (§§ 473-482), com a intenção de 1) mostrar que o arbítrio (Willkür) é uma condição necessária e indispensável, mas insuficiente da efetivação do conceito de vontade livre ; 2) demonstrar, a partir da análise crítica do que Hegel concebe como a « contradição » própria do arbítrio, a necessidade da sua suspensão numa forma de vontade livre, que se tem a si mesma « por conteúdo, objeto e fim », e, assim, preenche os requisitos do que, para Hegel, é «a idéia », no sentido de elaborar um conceito positivo de liberdade, que seja o fundamento de um conceito igualmente positivo de direito.

 

13) Marly Carvalho Soares - O sentido do direito em Hegel

A proposta de uma análise em torno da problemática do direito, da efetivação da liberdade é oriunda das exigências de um compromisso político, em face da crise dos direitos humanos, unida à necessidade de melhor esclarecer questões concernentes a temas que se nos apresentam relevantes no contexto hodierno. A reviravolta historiocêntrica provocada por Hegel em todo o pensamento político tem como pressuposto uma retomada da reflexão política das duas grandes épocas; o pensamento político clássico e o pensamento político moderno. Este fato se evidencia, na síntese dialética construída por Hegel dos temas fundamentais que regem cada uma dessas épocas: de um lado, a bela totalidade ética, da Pólis, de outro lado, a primazia da subjetividade com a idéia de afirmação dos direitos individuais, como direitos naturais, antecedentes à constituição da própria sociedade. Pretendemos mostrar como Hegel, ao justificar os Direitos do homem, conseguiu superar a perspectiva liberal individualista dos teóricos do Direito Natural Moderno mediante uma concepção orgânica da sociedade e do estado, sem por isso defender o totalitarismo estatal, o qual absorve as liberdade individuais. A grande tarefa de Hegel é como superar, dialeticamente, esses momentos por ele considerados abstratos: como conciliar o individual e o social, o reino das necessidades e o reino da liberdade, ou ainda a relação do homem com as coisas e consigo mesmo. Eis a interrogação para Hegel, e é, na ciência filosófica do Direito, que ele vai tentar reconciliar esses dois momentos, atrávés da esfera da eticidade. O horizonte hermenêutico da nossa leitura é o sistema hegeliano, dentro do qual a filosofia política, como ciência filosófica do Direito, tem por objeto a idéia do Direito, isto é, seu conceito e sua realização. A filosofia do Direito é um momento dialético da Filosofia do Espírito , correspondente ao Espírito objetivo, 2ª secção da Enciclopédia das Ciências Filosóficas. Por sua vez, a Filosofia do Espírito é, no sistema hegeliano, o momento da inflexão da idéia que retorna a si mesma, como liberdade. Trata-se, então, não de um discurso metafísico sobre a liberdade, mas da sua realização objetiva cultural e histórica.

 

14) Oscar Cavalcanti de Albuquerque Bisneto - A relação dialética entre o sistema de Hegel e os tropos céticos de Agripa

A perspectiva do presente trabalho consiste na articulação de três momentos precisos: em primeiro lugar, busca realizar uma apreciação do real significado que possui os tropos de Agripa para a estratégia cética de Hegel; em segundo, procura expor criticamente a interpretação hegeliana das aporias legadas pela tradição filosófica, não apenas as do ceticismo antigo, mas sobretudo a do dualismo da filosofia crítica de Kant; e, finalmente, procura evidenciar, desse modo, como Hegel, quer para negar, quer para defender-se, quer até mesmo para afirmar, sempre e necessariamente está a pressupor os tropos como o único paradigma metafísico, somente a partir do qual ele poderia legitimamente fundar o início do seu Idealismo Absoluto. Ora, se já é um lugar comum afirmar que Descartes extrai a validade da certeza do cogito ao levar as objeções do ceticismo às suas últimas consequências, então, em se tratando da estratégia cética de Hegel, asseveramos que ele pouco se distancia da postura cartesiana. Pois, igual ao cogito, o ponto fixo de Descartes, o primeiro conceito da Lógica - e que por isso deve servir de eixo de sustentação para todo o Sistema - tem de ser totalmente imune aos ataques lançados contra a possibilidade segura de um legítimo início para a ciência. De modo que este primeiro conceito da Lógica não será outro que o puro ser, tacitamente adquirido junto aos tropos, que, por ser absolutamente vazio de determinações, não traz consigo nenhuma pressuposição, resultando assim supostamente incólume face às arguições céticas.

 

15) Verrah Chamma - As condições público-políticas da realização efetiva da liberdade: O Estado substancial na Filosofia do Direito de Hegel

O Estado hegeliano deve ser pensado como o resultado e o momento lógico final do processo necessário de auto-efetivação de seu princípio, a saber, a vontade livre. Embora Hegel reconheça que a vontade já fora anteriormente instituída como o princípio que funda e legitima o Estado moderno, ele aponta que a compreensão que filósofos importantes como Rousseau e Kant tiveram dela é ainda parcial e limitada, e portanto, inadequada para explicar a verdadeira natureza do Estado.
A apreensão lógico-especulativa da vontade revela que a vontade particular que subjaz à concepção contratualista do Estado não passa de um momento, ainda que essencial, do movimento de determinação progressiva da vontade livre, pelo qual a liberdade, como seu conceito e fim, é objetivamente realizada na exterioridade do mundo e em suas instituições. A suspensão ou sobressunção (Aufhebung) dos momentos finitos ou ideais da vontade livre resulta, com efeito, na sua resolução em uma síntese positiva que é lógica, ontológica e institucionalmente superior a eles, ou seja, todas as determinações abstratas da vontade livre, isto é, a liberdade em todas as suas diferentes formas ainda não universais, são finalmente integradas em uma unidade substancial internamente diferenciada, o Estado propriamente dito ou substancial. (Não trataremos aqui do Estado político, enquanto organismo que se diferencia internamente em poderes e dotado de soberania).
A força e originalidade da concepção hegeliana do Estado podem, então, ser enunciadas na tese de que ele é a “realidade efetiva da vontade substancial”, ou ainda, considerando-o a partir do desenvolvimento do conteúdo mesmo dessa vontade, que ele “é a realidade efetiva da liberdade concreta”. A explicitação de ambas as teses mostra que no Estado a dimensão propriamente objetiva, universal, ou ainda, ética da liberdade da vontade e a liberdade subjetiva da vontade particular estão unidas como um fim necessário da razão. No Estado, liberdade objetiva e subjetiva estão em uma relação não de oposição, mas de compenetração, e encontram tão-somente nele seu pleno direito, reconhecimento e realização. O Estado moderno não pode prescindir da particularidade e da subjetividade, todavia, não se resume a elas; ele é, pois, o universal concreto, a unidade substancial, o racional em si e para si, o fim último e em si mesmo.
Hegel resgata a primazia da esfera público-política ao reconhecê-la como a única na qual a liberdade é efetivamente realizada, e ao fazê-lo, ele vai além dos dois principais modelos da organização política ocidental, a polis grega e o Estado oriundo do direito natural moderno. Não obstante Hegel incorporar elementos de ambos os paradigmas em sua teoria do Estado, ele é agudo no diagnóstico das limitações inerentes a cada um deles. No primeiro, o princípio da liberdade subjetiva está absolutamente ausente; no segundo, este mesmo princípio é erigido em condição suficiente da existência do Estado. No Estado pensado especulativamente, o elemento da particularidade somente tem a sua verdade na universalidade concreta do âmbito público, este, por sua vez, apenas é consumado como tal nas ações, na vontade e na autoconsciência dos indivíduos singulares.

 

 

16)  Leonardo Alves Vieira - Dualismo, monismo e não-dualidade

 

A filosofia de Hegel é conhecida como aquela que procura vencer os dualismos: sujeito e objeto, finito e infinito, fenômeno e essência, substância e sujeito, para citar alguns exemplos. Para tanto, a dialética não deve ser compreendida como uma forma lançada sobre um conteúdo a ela externo e alheio. A dialética é o desdobramento da lógica ínsita ao próprio objeto, de tal forma que este desdobramento gere, a partir de si mesmo e em si mesmo, suas oposições. Portanto, as oposições são imanentes ao movimento de um e mesmo objeto, lados opostos de uma mesma realidade que ora apresenta uma face, ora a face oposta. Assim sendo, os elementos opostos não têm uma existência substancial neles mesmos, mas existem somente na relação que mantêm entre si. Não existem, pois, duas realidades opostas, mas uma só realidade desdobrada internamente em elementos opostos.  Em virtude disto, em oposição ao dualismo, qualifico a posição filosófica por Hegel defendida como um monismo: uma só e mesma realidade desprendendo os elementos opostos que lhe são próprios. Hegel, no entanto, não consegue avançar além do monismo. Traduzindo sua posição em linguagem plotiniana, Hegel se detém no plano do espírito, em que ainda prevalece a oposição entre inteligência e inteligível, não progride, contudo, em direção ao Uno. Diante do Uno, tanto no caso da dialética hegeliana quanto no caso da plotiniana, o discurso que lida com as oposições perde sua força inteligível. Não é por acaso que Hegel se insurge com qualquer objeto que seja apresentado no seu caráter absolutamente imediato, privado de mediações e contradições. Daí, também, sua crítica à intuição intelectual, ao ato intuitivo da razão. Neste ponto, ele concorda com Kant, o qual também admite apenas uma razão discursiva. Hegel foge do dualismo (p. ex., o de Kant) na medida em que interpreta o Absoluto como uma relação a ele ínsita entre imediato e mediatizado (monismo). Não consegue, todavia, superar um Plotino ou um Shamkara na medida em que não aceita a não-dualidade, aquilo que escapa ao jogo de opostos. Destas diferenças resultam várias conseqüências. Eis algumas delas: 1) o Absoluto, tal como interpretado por Plotino e Shamkara, não carece de uma consciência de si a ser alcançada ao longo de um desenvolvimento; 2) no âmbito da antropologia, a exigência da não-dualidade pressupõe o reconhecimento de uma faculdade que proporcione ao ser humano a experiência daquilo que a razão discursiva não lhe pode oferecer.

 

início

 

 

 

 

 

 

Trabalhos Inscritos no XI ENCONTRO NACIONAL DE FILOSOFIA DA ANPOF,

Salvador, Bahia, 18 a 22 de outubro de 2004

 

Matrizes Hegelianas da Crítica da Modernidade – Resumos

 

 

Mesa-Redonda

O Sistema de Hegel: Formação e Fundamentação

 

MODERADOR:

Prof. Dr. ALFREDO DE OLIVEIRA MORAES, UNICAP

 

 

SÉRGIO LUIS TOMIOKA, Doutorando FFLCH- USP

tomioka@amcham.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 

Idealismo transcendental: sinais de futuro

 

O pós-kantismo traz para o pensamento filosófico uma série de discussões inovadoras, que vão da instituição de uma lógica transcendental à de uma dialética como a hegeliana, ou de uma moral como Razão prática a uma razão prática como atividade originária do Eu, ou mesmo da discussão sobre os limites da experiência possível à discussão das experiências da razão como fenomenologia. Qualquer desses temas trazem um elemento novo que é o da possibilidade de uma nova metafísica centrada no sujeito transcendental.

Se essa nova ordem de análises indicava um caminho a seguir e um campo aparentemente determinado de estudos, ao mesmo tempo, era incapaz (não por deficiência sua) de notar saídas que hoje nos são familiares.

Hoje é impossível pensar a lógica sem pensar na revolução lógica feita na primeira metade do século passado; hoje é impossível pensar uma descrição da alma humana sem considerar as discussões da psicanálise. A conseqüência dessa revolução na lógica é uma mudança tanto na consideração do que é lógico, quanto na de qual deve ser o objeto da lógica, isto é, quais devem ser seus limites. A conseqüência do novo modo de pensar a alma humana é uma mudança metodológica e outra que diz respeito ao limite dessa novidade, isto é ao seu objeto.

Esse artigo pretende mostrar que o idealismo alemão não podia enxergar esses caminhos da história do pensamento, mostrando que o ponto cego idealista reside nos limites da lógica aristotélica e que há um intento idealista que coincide com o de uma disciplina que procura, através da via segura da ciência, compreender a alma humana. Além disso, pretende mostrar que o espírito idealista (a letra não podia chegar nisso!) indica uma relação intrínseca entre uma ciência lógica e uma das faculdades da alma, hoje doutrinas separadas. Isto é mostrar em que medida o idealismo alemão faz ainda algum sentido.

 

 

FÁBIO COELHO MALAGUTI, Mestrando PUC-Rio

fabcmal@terra.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 

As relações entre o Eu e o Absoluto na Fenomenologia do Espírito.

 

O trabalho concentrar-se-á no capítulo VIII da obra em questão, tentando capturar os movimentos, aí indicados, do Eu e o Absoluto, ou seja, refazer, considerando-se o tempo de exposição, as relações hegelianas entre tais conceitos.

Sabe-se que o conceito de Eu perpassa todos os movimentos dialéticos da obra, e revelar-se-á como algo apartado, incompleto. Se ao desvelar-se no Absoluto ele se mantém é a questão a ser investigada. Dito de outra forma: Como acontece a Aufhebung do Eu no Absoluto?

 

 

Profa. Ms. MÁRCIA ZEBINA ARAÚJO DA SILVA, UFG/ Doutoranda Unicamp

Marcia.araujo@cultura.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 

Teleologia interna e vida lógica no pensamento de Hegel

 

Nos ocuparemos, nesta comunicação, do tratamento da teleologia interna como vida lógica. Para tanto, será necessário compreender este conceito a partir do processo de explicitação de suas fontes, o que nos remete ao tratamento da teleologia externa na seção intermediária da Doutrina do Conceito - a Objetividade. A passagem da teleologia externa à teleologia interna, que vem a ser a passagem da Objetividade à Idéia, obedece a uma necessidade interna de explicitação do conceito. A insuficiência da finalidade externa é suprassumida em finalidade interna e ocorre, na Ciência da Lógica, na abordagem da vida lógica ou idéia imediata. A vida vem a ser o primeiro momento da Idéia e, de certa maneira, também o último, visto que o acabamento da Ciência da Lógica, com a Idéia Absoluta, já expressa a necessidade de  sua passagem à natureza (vida orgânica). Procuraremos mostrar: 1) em que medida o projeto hegeliano constitui-se em uma resposta e em um passo adiante ao tratamento do mesmo tema na filosofia kantina; 2) de que modo o conceito de ser-vivo poderá ser tomado como o conceito fundamental da filosofia especulativa de Hegel.

 

 

Prof. Ms. MANUEL MOREIRA DA SILVA, UNICENTRO/PR

mmdsilva@yahoo.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 

O Sistema de Hegel, Idealismo objetivo ou especulativo?

 

Esta comunicação visa estabelecer os parâmetros mediante os quais, antes de tudo, possamos determinar e desenvolver os elementos fundamentais daquele terreno comum que Hegel, em carta a Windischman, de 23 de agosto de 1823, denominou ‘o ponto de vista especulativo’; o qual, para Hegel, nessa mesma carta, tratava-se “primeiramente, apenas de ser assegurado”. Em defesa de um tal “ponto de vista”, nossa comunicação apresentar-se-á como uma tentativa de delineamento do mesmo em confronto com a renovação idealístico-objetiva do Sistema de Hegel, propugnada nos dias de hoje por Vittorio Hösle, que, em sua obra considerada mais erudita, intitulada ‘Hegels System. Der Idealismus der Subjektivität und das Problem der Intersubjektivität’, não só toma o Sistema de Hegel como algo já datado historicamente, como também rejeita o especulativo enquanto tal em sua determinação propriamente hegeliana. Se, por um lado, é possível conceder que hoje em dia o Sistema de Hegel apresenta-se de fato como “algo já datado historicamente”, o que não significa necessariamente que ele não seja atual; por outro, e justamente por sua atualidade, isso não implica de modo algum em se rejeitar o especulativo tal como ele comparece em Hegel ou em reduzi-lo ao transcendental, mesmo que ao “transcendental absoluto”, entendido por Hösle como o ponto de vista idealístico-objetivo, aquele no qual “em primeiro lugar, se admite categorias aprióricas e juízos sintéticos a priori e, em segundo lugar, lhes dá uma dignidade ontológica”, isto é, se lhe configura como um “a priori objetivo”. Cabe-nos, portanto, não só assegurar a existência de uma esfera propriamente idealístico-especulativa, como também demonstrar sua irredutibilidade ao plano meramente idealístico-objetivo ou “transcendental absoluto”.

Essa demonstração, por suas características próprias, uma vez que ela mesma se quer como especulativa, e devido aos limites de uma comunicação, limitar-se-á unicamente a retomar e desenvolver o conceito hegeliano de objetividade, die Objektivität, em suas linhas fundamentais, mediante a oposição do “a priori objetivo” de Hösle. De início, apresentaremos o ponto de vista de Vittorio Hösle no que tange ao problema da objetividade no Sistema da Filosofia, no âmbito da constituição do que ele designa ‘Idealismo objetivo’, de modo a explicitar (1) os fundamentos de sua interpretação do sistema hegeliano como uma Filosofia transcendental absoluta e (2) as principais críticas que faz ao Sistema de Hegel enquanto interpretado desse modo. Depois disso, retomando e desenvolvendo o conceito hegeliano de objetividade, sobretudo no que concerne ao mundo do espírito, bem como os elementos que constituem o cerne da oposição de Hösle à sua tematização em Hegel, o “a priori objetivo” e a Intersubjetividade (como estrutura reflexiva transcendental absoluta), delinearemos o processo mesmo de sua suprassunção no âmbito da verdade – entendida como correspondência da objetividade, incluindo aí a intersubjetividade, ao conceito – ou, na esfera do Idealismo especulativo propriamente dito. Enfim, mostraremos que o Sistema de Hegel, ao incluir o Idealismo objetivo como um de seus momentos, por isso mesmo, não se limita a ele.

 

 

Palestras

 

Prof. Dr. JOSÉ CRISÓSTOMO DE SOUZA, UFBA

crisouza@ufba.br e jose_crisostomo@uol.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 

A “Des-subjetivação” de Hegel por Marx

 

Apesar dos elogios de Marx à consideração de Hegel pelo que é real e objetivo, em contraste com desenvolvimentos “idealistas” de outros discípulos, e apesar da sua adesão à superação hegeliana do idealismo kantiano, o viés da sua crítica e do seu próprio desenvolvimento de Hegel apresenta-se reiteradamente como “anti-subjetivista” ou, como diriam seus rivais na esquerda hegeliana, como “substancialista”. É essa caracterização do desenvolvimento marxiano do hegelianismo que procuramos construir com uma mirada em Hegel e com base na análise de alguns textos de Marx que tomam o assunto mais diretamente. Fazem parte de tal caracterização sua preferência pela “influência exterior” e pela “passividade” ou “receptividade” (em oposição à “ação pessoal”, à “auto-atividade”, à “independência” e à “espontaneidade espiritual”), bem como sua desqualificação de qualquer negatividade que encontre suporte no sujeito e no pensamento. É como se Marx revisse o aproveitamento que Hegel faz de Espinosa, sem acompanhar integralmente a passagem hegeliana a uma “lógica subjetiva”. Recaindo, em vez disso, como queremos sugerir, na lógica da substância, substância que é dotada agora, por ele, de uma “atividade” que não é subjetiva, e de uma “negatividade” ainda puramente objetiva. Está em jogo, aqui, o esforço de Marx de constituir um ponto de vista crítico sólido, que escape inteiramente aos vícios do subjetivismo moderno, entre os quais sua imperfeita compreensão da liberdade, a qual se situa nos limites do ponto de vista da “sociedade civil”, e impede, por princípio, a constituição de uma comunidade digna do nome, unificada e livre. Como procuramos mostrar, o materialismo histórico marxiano permite colocar a divisão do trabalho na raiz da oposição da consciência com realidade, de modo que, mesmo quando a consciência entra em contradição com a realidade, “isso só pode decorrer do fato de que as relações sociais existentes entraram em contradição com a força produtiva existente”. O que representa, então, o fim da consciência enquanto negatividade oposta ao que é universal e objetivo. A negatividade puramente objetiva e material que Marx concebe, não apenas representa a única, verdadeira e legítima força contra toda “positividade”, como também contra a negatividade dita não-substancial, meramente subjetiva, dos indivíduos. Marx localiza a negatividade, desse modo, no nível da vida material mesma – da “substância”, poderíamos dizer. Quando então se trata de uma negatividade substancial, que não radica de modo algum na subjetividade, nem depende dela.

 

 

 

 

Prof. Dr. ALFREDO DE OLIVEIRA MORAES, UNICAP

amoraes@unicap.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 
"Absoluto, Realidade e Atualidade" - Interpelações desde o pensar hegeliano.
 
O autor aborda as relações e implicações entre os conceitos de Absoluto e Realidade, desde uma perspectiva da atualidade, tomando como fundamentação o pensar hegeliano, ou seja, o modus operandi do pensamento hegeliano tal como se apresenta em seu sistema filosófico. Para tal, reconstrói a demonstração conceitual do Absoluto (conforme apresentado por Hegel na Enciclopédia das Ciências Filosóficas) e problematiza sua relação com a realidade, considerando a visão de realidade das formulações ínsitas na filosofia de G. W. F. Hegel, naquilo que elas encontram na atualidade científica (Física contemporânea, cibernética e teoria dos sistemas) possibilidades de efetivação. Em conclusão, é posta a pergunta: Por que interpelar a temática em foco desde o pensar hegeliano? Para a qual se oferece como resposta uma breve indicação da atualidade das inquietações advindas desse pensar, dentro desse horizonte o autor apresenta, inclusive, como uma possibilidade que parte da ‘incompreensão’ e ‘obscuridade’ atribuída ao texto hegeliano se deve, principalmente, ainda que não exclusivamente, às inquietações provocadas pela leitura de sua filosofia.
 
 

Comunicação

 

LUIZ FERNANDO BARRÉRE MARTIN, Mestrando UNICAMP

luizbmartin@ig.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 

O ceticismo na filosofia do jovem Hegel

 

Segundo Hartmut Buchner, a despeito do ceticismo ser um tema bastante trabalhado na filosofia clássica alemã, sobretudo em Kant, nos primeiros kantianos e críticos de Kant, chama a atenção a originalidade e o rigor da interpretação hegeliana do ceticismo, em especial, no artigo "O relacionamento do ceticismo com a filosofia". À primeira vista, a intenção de Hegel no artigo é apenas criticar o ceticismo de Gottlob E. Schulze, mostrando a má compreensão que este autor possui do ceticismo antigo e a enorme distância que há entre o que propõe esse ceticismo moderno e o que propõe o ceticismo antigo. Contudo, mais importante do que essa crítica é o comentário hegeliano do ceticismo. Veremos então Hegel encontrar no ceticismo antigo um modo de pensar original e de grande interesse para sua filosofia. Para Hegel, há por parte do ceticismo antigo o reconhecimento do caráter antinômico do finito. A um finito posto pelo entendimento, o cético põe o seu contrário, de modo que se estabeleça a antinomia. O ceticismo mostra dessa maneira que a todo finito posto pelo entendimento como absoluto, um contraposto pode a ele ser relacionado de modo que seja negado seu caráter absoluto. Ao mostrar que todo finito é condicionado por um outro, o ceticismo exprime um princípio de razão. Trata-se aqui de retomar alguns aspectos da análise hegeliana do ceticismo pirrônico, de modo que se possa compreender até que ponto é pertinente para Hegel uma aproximação do ceticismo com a sua filosofia.
 
 

Mesa-Redonda

A Filosofia do Direito de Hegel e o Estado constitucional

 

MODERADORA:

Profa. Ms. MÁRCIA ZEBINA ARAÚJO DA SILVA, UFG/ Doutoranda Unicamp

 

 

Prof. Dr. JOSÉ PINHEIRO PERTILLE, UFRGS

jose.pertille@ig.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 

As faculdades do espírito em Hegel
 

A Filosofia do direito é apresentada por Hegel como uma exposição em detalhe de sua doutrina do espírito objetivo. Nesse marco sistemático, o primeiro movimento tem de ser a recuperação dos desdobramentos principais do espírito subjetivo que conduziram à sua suspensão em espírito objetivo. Isso é feito na Introdução, versão condensada da teoria hegeliana da liberdade, enquanto resultado da articulação entre os espíritos teórico e prático. Ora, aqui estamos no centro das questões envolvendo a “psicologia” hegeliana, que tem como um de seus principais contrapontos a teoria das faculdades da alma (die Seelenvermögen). A crítica de Hegel ao pensar o espírito a partir de suas faculdades é dirigida por razões metodológicas, ou seja, pela sua não fragmentação em uma multiplicidade sem unidade. Mas, além desse leitmotiv do hegelianismo, também estão em jogo as relações entre inteligência e vontade, enquanto condição fundamental para se pensar a realidade efetiva da auto-determinação do espírito. Isso envolve um aprofundamento da noção das “potências” do espírito e suas atualizações. As conseqüências dos diferentes equacionamentos dessa relação são tratadas por Hegel através de suas análises da psicologia empírica, da filosofia engajada e da liberdade negativa do entendimento. Em troca, a definição hegeliana de vontade livre emerge com mais visibilidade mediante tais considerações.

 

 

BAVARESCO, AGEMIR; CHRISTIANO, SÉRGIO B.; SCHMITD. ERNANI

Instituto Superior de Filosofia/Universidade Católica de Pelotas

abavaresco@terra.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 
Metamorfoses do Estado constitucional e Hegel

 

Os desafios dos princípios republicanos face às sociedades pluralistas e multiculturais; do Estado-Nação e as unidades Supranacionais e dos cidadãos face à sociedade mundial colocam o problema de como o Estado Constitucional, na medida em que for competente para manter a relação público-privado, interior-exterior poderá implementar uma democracia efetiva e um Estado de direito inclusivo?

Face a este problema a elaboração da pesquisa bibliográfica analisou os modelos constitucionais histórico-políticos em relação a teoria hegeliana sobre a Constituição. Apresentam-se três modelos de Estado constitucional: o Liberal, o Social e o Democrático. Descrevem-se, após, três modelos normativos de democracia: o liberal, o republicano e o da política deliberativa  ou procedimental proposto por Habermas. Partindo da teoria hegeliana constitucional, aponta-se a contradição fundamental dos modelos que se dá entre o conceito formal-atomista liberal e  conceito substancial-orgânico comunitarista.

Os modelos constitucionais formais carecem de legitimidade pois, mantém na prática uma situação de exclusão da cidadania. A Constituição é, para Hegel, uma estrutura objetiva de um organismo político e não apenas uma lei formal que legitima o Estado de Direito. A Constituição funda a concepção orgânica de Estado que se opõe à visão atomista dos jusnaturalistas. Estado e Constituição são co-extensivos, ou seja, trata-se de um conceito ético-político que nasce do “espírito do povo”. Não é o produto de uma lei formal, mas uma criação contínua e substancial. A razão hegeliana não se sobrepõe à história, mas também não se limita a justifica-la, daí a dialética entre o espírito do povo e o espírito do tempo, como momentos constitutivos do conceito de Constituição hegeliana.

 

Palestras

 

Prof. Dr. LEONARDO ALVES VIEIRA, UFMG

leonarva@terra.com.br

(Divulgação de e-mail autorizada)

 

 

Níveis de consciência e linguagem. O discurso da consciência natural na seção “(A) Consciência” da Fenomenologia do Espírito (1807)

 

O objetivo do trabalho é investigar a relação entre uma determinada figura da consciência e a linguagem por ela utilizada para fazer valer seu critério de verdade. O âmbito de análise será a seção “consciência” da Fenomenologia do Espírito de Hegel. A hipótese de trabalho consiste no fato de que, concomitantemente à mudança na relação entre saber e verdade na passagem de uma figura da consciência para outra, há também o surgimento de um novo horizonte de linguagem para a consciência natural.

O primeiro passo diz respeito à identificação da concepção hegeliana da linguagem. Para tanto, lançarei mãos dos manuscritos das preleções (Vorlesungsmanuskripte) durante sua estadia em Jena, nos quais possa ser constatada uma abordagem sistemática da linguagem no contexto do devir da consciência, a qual, então, sirva de referência básica para o estudo da consciência e sua linguagem no âmbito da Fenomenologia do Espírito.

Com base nisso, a experiência da consciência na certeza sensível nos aponta o falar ou o dizer como uma ameaça para a pretensão à verdade defendida por ela nesse estágio de sua evolução: a verdade resultante de sua experiência na certeza sensível se opõe à verdade opinada.

Já no caso de sua experiência na esfera da percepção, o uso da linguagem tem um caráter soteriológico, pois ela entra em ação para livrar o objeto de uma “verdade oposta” existente nele, mas não aceita pela consciência natural enquanto consciência que não sabe articular de um modo satisfatório a coisa e suas múltiplas propriedades.

Finalmente, o capítulo força e entendimento nos mostra um outro uso da linguagem. Aqui a consciência natural tem dificuldade em coordenar a reflexão que ocorre no sujeito com aquela que tem lugar no objeto. Daí, então, ela recorre a uma explicação que a satisfaz e se deleita nesta conversa consigo mesma.

 

 

Prof. Dr. MARCOS LUTZ MÜLLER, UNICAMP

(Divulgação de e-mail não autorizada)

 

Matrizes Hegelianas da Crítica Filosófica da Modernidade

 

 

No intuito de esclarecer o título programático que nomeia o GT em pauta e delinear alguns pontos de referência para um debate da questão substantiva assim designada, a palestra tomará como ponto de partida a crítica hegeliana à filosofia da reflexão e do entendimento, nos primeiros artigos do período de Jena, que se prolonga na crítica ao Esclarecimento e à ambigüidade da Bildung e da sua racionalidade teleológica, na Fenomenologia do Espírito, para caracterizar a tese especulativa fundamental, que permite compreender o idealismo absoluto de Hegel ao mesmo tempo como expressão e crítica da modernidade, uma crítica à racionalidade instrumental e estratégica de uma razão reduzida, nos Tempos Modernos, ao entendimento calculador e utilitarista, e, ao mesmo tempo, como um aprofundamento e uma transformação da crítica e do princípio da autonomia kantianos, concebidos através da sua radicalização especulativa, na autonomia absoluta do pensamento enquanto tal, como o fundamento da modernidade. Ambos os aspectos convergem na tese de que a modernidade tem o seu núcleo na “independência da razão” e na autonomia absoluta do pensamento, que “se tornou, de agora em diante, o princípio universal da filosofia, bem como o pré-conceito da época atual” (Enciclopédia, § 60 A), tese que se desdobra na concepção de que o mundo é o produto da idéia, entendida como a liberdade absoluta e infinita, que dissolve no abismo da sua negatividade a mera positividade das tradições e os dogmatismos do senso-comum, e que só reconhece como válido o que se justifica perante essa autonomia.

O ponto culminante da exposição dessa tese e a sua explicitação mais convincente se encontram no capítulo conclusivo da Ciência da Lógica, A Idéia Absoluta, e tem o seu desenvolvimento político mais amplo na teoria da efetivação da Idéia de liberdade, enquanto espírito objetivo, nas formas de vida ética e em suas instituições, cuja efetividade radica, idealistamente, na compreensão e avaliação que delas têm os indivíduos que as partilham (Filosofia do Direito, § 274), e cujos princípios de justificação já estão sempre historicamente mediados e sempre abertos à negatividade de uma autonomia mais radical que os deslegitima ulteriormente.

A compreensão inaugural da modernidade como um problema filosófico, por Hegel, é, na sua autocompreensão, essencialmente uma crítica das “insatisfações” e das “patologias” da modernidade, dos seus bloqueios e das suas desfigurações, uma crítica que pretende, contudo, nos momentos mais radicais do seu idealismo, devolver a modernidade a esta auto-referencialidade do pensamento, enquanto processo absoluto, que não tem mais medida externa ou transcendente, e que torna a modernidade, talvez, essencialmente inconclusa.

 

Fim dos resumos de MATRIZES HEGELIANAS DA CRÍTICA DA MODERNIDADE!

Manuel Moreira da Silva, Scretário MHCM.

 

 

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