O artigo reflete a respeito da formação do sujeito na
psicologia, tendo como principal referência teórica o interacionismo
social de George Herbert Mead (1863-1931) e de L. S.
Vigotsky
(1896-1934), mas com o privilegiamento do
primeiro autor citado. O texto é iniciado situando a perspectiva
teórico-metodológica de Mead e Vigotski no interior do processo
histórico de nascimento da psicologia científica, trazendo elementos
para a reflexão acerca da dimensão social na formação do sujeito na
psicología nos dois autores. Em seguida, destaca as contribuições do
primeiro, com base na aceitação da concepção de Joas (1985)
de que “uma compreensão cientifica adequada da teoria da intersubjetividade
promete conseqüências de longo-alcance tanto para a lógica das ciências
sociais quanto para a reformulação contemporânea do materialismo
histórico” (p.1), um esforço frutífero desenvolvido pela teoria social
de Mead.
Neste texto, o reconhecimento da filiação dos autores acima
citados ao interacionismo social se deve a Bronckart (2003), visto o
autor afirmar que
a expressão
interacionismo social designa uma posição epistemológica geral, na
qual podem ser reconhecidas diversas correntes da filosofia e das
ciências humanas. Mesmo com a especificidade dos questionamentos
disciplinares particulares e com variantes de ênfase teórica ou de
orientação metodológica, essas correntes têm em comum o fato de aderir à
tese de que as propriedades específicas das condutas humanas são um
resultado histórico de socialização, possibilitado especialmente
pela emergência e pelo desenvolvimento dos instrumentos semióticos (2003, p.21).
Tal posicionamento
não nega o fato do homem ser um organismo vivo e, como tal, possuir
algumas de suas muitas propriedades comportamentais influenciadas pela
configuração do potencial genético e pelas condições de sobrevivência da
espécie. Na verdade, o interacionismo social defende, de acordo com
Bronckart (2003), ser uma ilusão tentar interpretar o especificamente
humano, ou, para utilizar uma terminologia de Vigotski (1998,2000,
2001), as funções psíquicas superiores (pensamento, linguagem, memória,
a consciência de forma geral, etc.), buscando uma referência direta no
substrato neurobiológico humano ou concebendo-as como o resultado de
aprendizagens condicionadas. Partindo do pressuposto de que o que funda
o especificamente humano é a interação reciproca entre os homens,
mediada pelos conteúdos produzidos na cultura, o interacionismo social
leva até as últimas conseqüências a materialidade e a historicidade do
homem e da cultura (Bronckart 2003), idéias presentes em Vigotski
(1998,2000, 2001) e Mead (1967).
O nascimento da
psicologia científica e o interacionismo social de Mead e Vigotski
A história da psicologia tem conhecido momentos distintos,
nas quais tendências específicas lutam no campo do conhecimento em busca
de hegemonia discursiva e prática. Um período histórico significativo em
que isso ocorreu se deu em torno do último quartel do século XIX e o
primeiro do século XX , quando esteve em jogo um rico movimento de
reflexão, voltado para a investigação do psiquismo em novas bases.
Naquele momento, a possibilidade de constituição de uma disciplina
científica implicava um esforço de interrogação das diferentes
tendências na psicologia, quanto às possibilidades de ingresso na era da
ciência. Destarte, em fins do século XIX, a psicologia se perguntava
sobre o fazer cientifico, na sua busca de critérios de afirmação como
ciência; ou seja, sobre as bases para se propor a funcionar como
disciplina científica. Porém, não existia uma única resposta para a
indagações sobre a composição desse campo cientifico.
O terreno epistemológico em que esse debate ocorrera,
denominado era da positividade colocava em ameaça todo saber tido
como metafísico, pois na época moderna os modelos de
cientificidade, a referenciarem qualquer conhecimento a reivindicar o
estatuto de cientificidade, provinham da matemática e da física (Japiassu,
1982).
Ao estabelecer como critério da cientificidade a predição,
a descrição e o controle do comportamento, o positivismo deslocou o
objeto das ciências humanas, o homem, para as ciências experimentais.
Com isso ocorreu uma renúncia a qualquer concepção de homem que não se
mostrasse capaz de tratá-lo experimentalmente, como fato ou como
coisa.
Para Japiassu (1982) as ciências humanas estabeleceram um
estatuto de cientificidade mais ou menos próprio que veio a marcar a
cultura contemporânea e, por muito tempo, vigiaram para que o estatuto
científico conquistado fosse respeitado. Mas, atualmente, poucos
protegem uma cientificidade alicerçada no modelo das ciências exatas,
pois profundas mudanças sociais e a virada lingüística, que veio
a penetrar no campo do conhecimento, colocaram a noção positivista de
verdade científica em suspeição.
Na psicologia, no transcorrer do século XX, no interior do
mesmo processo em que se fortalece a hegemonia de tendências que
incorporaram a exigência de positividade, a exigirem controles
subjetivos do sujeito e do objeto do conhecimento, continua um
movimento de compreensão do psiquismo que tem seus antecedentes na
filosofia, e que ganha expressão mais contundente nas décadas que seguem
o pós-guerra.
Aderindo a uma
epistemologia positivista, a psicologia científica atingiu um estatuto
reconhecido no campo de conhecimento. Muito embora a cientificidade
dessa jovem ciência tenha sido conquistada, os fundamentos em que ela se
alicerça não são estáveis, pois se afirmaram por conta da omissão e do
desaparecimento de outras possibilidades de se fazer reconhecida no
campo do saber acadêmico. Pois no processo mesmo de concretização do seu
empreendimento científico, no momento mesmo de definição de seu estatuto
de cientificidade, algumas questões foram exiladas apressadamente do
terreno da ciência psicológica, embora deixassem marcas na história do
conhecimento humano.
Esquivadas por um
longo tempo, tais questões reaparecem no devir histórico para afirmar a
função emancipatória da psicologia, recolocando a discussão da
cientificidade em outro patamar. É o retorno de teorias que refletem a
formação do sujeito em íntima relação com a vida social, concretizada
nas experiências tecidas pela sua participação em empreendimentos
culturais oferecidos pela sociedade e que são vividos na família, na
escola e demais instituições sociais. Ao mesmo tempo em que o
positivismo nas ciências humanas constrói um conhecimento que
desantropologiza o homem, em nome do modelo das ciências naturais (Japiassu,
1982), uma outra matriz do pensamento o antropologiza, assumindo
como desafio a busca da constituição da realidade humana por meio do
deciframento das mediações lingüísticas para compreensão dos nexos entre
os processos de socialização e de individuação vividos pelos sujeitos.
Destarte, a adesão aos ideais de cientificidade das ciências
experimentais conduziu a psicologia ao rompimento com uma matriz de
pensamento que identifica no processo de constituição do sujeito a
dimensão social, revelada na íntima relação entre linguagem, consciência
e experiência.
Neste artigo,
retomamos a perspectiva teórico-metodológica do interacionismo social,
desenvolvida entre o último quartel do século XIX e as três primeiras
décadas do século XX que, embora busque referências empíricas, vista
como necessárias para a elaboração do conhecimento científico, faz da
relação linguagem e experiência o objeto privilegiado de sua reflexão. É
o retorno de uma psicologia social excluída da história da psicologia
científica, que retorna ao campo de reflexão para falar da formação do
sujeito, com base em um processo formativo de entrelaçamento da
socialização e da individuação. Quanto aos motivos dessa exclusão
Bronckart (2000) é enfático ao afirmar que
em numerosos casos [a exclusão], foi
conseqüência da vontade dos psicólogos de abandonar as problemáticas de
socialização e de educação para ingressarem na ciência verdadeira
(leia-se: na psicologia como ciência natural). Foi o caso em Genebra,
onde Piaget, em condições eminentemente conflituosas, pôs termo à
tradição de Claparède, continuada por A. Rey. Foi o caso, nos Estados
Unidos, do desaparecimento da corrente behaviorista social encarnada por
Mead, em favor do behaviorismo fisicalista radical de Weiss, Watson e,
depois, Skinner. Foi o caso um pouco diferente, na Rússia, do manto
sobre o pensamento vygotskiano, em função de oportunismo político e
científico (2000, p. 2)
Tal matriz de pensamento traz, em seu bojo, uma lógica dialética para
suas reflexões sobre a relação do homem com a sociedade, contrapondo-se
à visão essencialista de um sujeito que cria mundos e que age
autonomamente por meio de uma consciência que precede a experiência,
enclausurada numa razão solitária muito presente na filosofia moderna.
Os autores rompem com essa concepção de razão ao introduzirem o agir
como mecanismo integrado ao pensamento e à consciência. Desse modo,
puderam avançar na superação da filosofia do objeto (da consciência) se
aproximando de uma filosofia da linguagem, ao enfatizarem que a formação
do sujeito se assenta na intersubjetividade, porque o processo de
individuação, do qual ele emerge, percorre uma rede de interações
sociais mediadas pela linguagem.
Referências ou pertenças do sujeito a determinados universos
socioculturais orientam as suas ações no mundo, conformando padrões de
interação intersubjetiva mediados por elementos da totalidade social.
Essa é uma linha comum a essas perspectivas teóricas, que geraram um
remanejamento de questões significativas relativas à subjetividade,
promovendo o rompimento com o dualismo cartesiano ao radicar a razão em
situações concretas.
A constituição de
referências empíricas para uma nova psicologia do sujeito, é fundamental
para Vigotski (1998,2000,2001) e Mead (1967) a colocar o comportamento
humano, e os processos cognitivos intrínsecos a ele, no contexto
sociocultural. Os autores recusam o individualismo metodológico, pois
partem da totalidade social na análise dos fenômenos elementares que são
objetos de investigação; ao mesmo tempo divergem do objetivismo que não
considera a experiência interior do indivíduo no amplo processo social,
experiência essa objetivada pela linguagem. Embora a noção de
totalidade, trazida pelos autores, guarde diferenças em relação à
tradição filosófica que referencia suas teorias, é necessário salientar,
conforme Bronckart, que
só é possível compreender essas correntes
a partir de sua ancoragem na filosofia pós-hegeliana do século XIX,
particularmente nos escritos de Marx e Engels de antes de 1850 e na Dialética da natureza (fim do século XIX). Referências explícitas em
Wallon e Vigotski, implícitas, dadas as circunstâncias, em Mead, mas,
entretanto, claras (2000, p. 2).
Com seus acentos
próprios, cada um dos autores retoma questões não superadas no processo
histórico em que se encontrava inserida a psicologia. Naquele período,
apesar do enorme esforço de Wundt em estudar os processos mentais
superiores, por meio de sua völkerpsychologie (psicologia dos
povos), permanecia na obra do autor um cartesianismo não suplantado, na
medida em que esta psicologia se desenvolvia em paralelo a uma
experimental que fazia parte da Naturwissenschaften (ciências
naturais) pois, embora o autor escrevesse sobre o individual e o
coletivo, a discussão aparecia em projetos diferenciados, dada a
dificuldade em estabelecer os liames entre essas duas dimensões (Farr,
1998).
Portanto, a obra de
Wundt apresentava duas vertentes principais, abrangendo: a) as ciências
naturais (naturwissenschaften); b) as ciências humanas e sociais
(geisteswissenschaften). Na primeira, encontramos sua psicologia
fisiológica, voltada para a descrição e a análise da experiência
sensorial, ou seja, uma psicologia experimental; na segunda encontramos
sua psicologia dos povos (völkerpsychologie), voltada à análise
social dos produtos da atividade humana, como mitos, costumes e
pensamento humano, ou seja, uma psicologia social (Farr, 1998).
Wundt compreendia as
dificuldades em estudar os processos mentais superiores por meio do
método experimental, defendendo, para tais temáticas, uma outra forma de
investigação, baseada em outros recursos metodológicos, como os estudos
comparativos entre diferentes culturas, a análise histórica e a
observação de campo. Desse modo, só uma parte da psicologia humana era
concebida por Wundt como susceptível de estudo por método experimental,
a outra parte deveria recorrer a teorias e métodos orientados para uma
psicologia social. Isso faz com que o autor não supere o dualismo
cartesiano na medida em que não consegue integrar, quer no plano
teórico, quer no plano empírico, a dimensão social e a fisiológica para
a compreensão dos processos mentais superiores.
Essa psicologia
social de Wundt foi recusada pela parcela mais expressiva da nova
geração de psicólogos, posterior a ele, que não aceitou a sua idéia de a
psicologia ser apenas em parte um ramo das ciências naturais. Por isso,
segundo Farr (1998), essa geração procurou mostrar que seu mestre estava
errado, buscando atingir os processos mentais mais profundos através do
método experimental. Em oposição a esse movimento em curso no interior
da psicologia, Mead e Vigotski, segundo Farr (1998), promoveram um
desenvolvimento posterior da Völkerpsychologie de Wundt, na
medida em que
na verdade, o
pensamento dos expressionistas alemães (isto é, Humboldt, Herder e
Hegel) com respeito à psicologia social da linguagem, juntamente com o
tratamento de Wundt sobre a linguagem (...), são responsáveis pela
marcante similaridade no pensamento de Mead com o de Vygotsky. Embora
fossem contemporâneos, nenhum deles, enquanto eu saiba, tinha
conhecimento do trabalho do outro (Farr, 1998, p. 46-47).
Em consonância com
tal perspectiva, Vigotski percebeu que o método adotado pela psicologia
moderna levou a que as funções psicológicas particulares se tornaram
objeto de análises isoladas, excluindo, desse modo, a organização destas
funções de uma estrutura integral psicológica superior. Apesar da jovem
psicologia reconhecer a consciência como uma totalidade, envolvendo
funções inter-relacionadas em sua atividade, essas inter-relações e a
totalidade a lhes oferecerem sentido não se tornaram objeto de pesquisa
(Vigotski, 2001). Para o autor, na busca de uma base empírica para a
elaboração do conhecimento e, no seu esforço de desenvolver
configurações ordenadoras da investigação, a exigir a constituição de
novas ordenações nos esquemas de pensamentos, a psicologia nascente
adota um a priori equivocado e aceito tacitamente por todos, ao
postular a unidade funcional da consciência, de modo que
reconhecia a
imutabilidade e a permanência das relações interfuncionais, e imaginava
a percepção ligada sempre da mesma forma à atenção, assim como a memória
estava vinculada à percepção e o pensamento à memória. Daí a conclusão
natural de que as relações interfuncionais são uma coisa que pode ser
colocada entre parênteses como multiplicidade genérica a ser desprezada
nas operações investigatórias (Vigotski, 2001, p. 2).
Como os pesquisadores concebiam que as relações entre as
diferentes funções psicológicas eram imutáveis e permanentes em suas
relações interfuncionais, repetindo sempre um mesmo padrão as relações
entre elementos como: a percepção, a atenção, a memória e o pensamento.
Desse modo, esses elementos poderiam ser colocados entre parênteses nas
operações investigatórias, não havendo atenção suficiente a essas
relações, o que levou ao deslocamento dos planos considerados
significativos no estudo das relações entre pensamento e linguagem. A
crítica de Vigotski às escolhas teórico-metodologicas da psicologia de
sua época se articula com a proposta de um método que concebe as partes
como condensando uma totalidade a permitir a captura do fenômeno
estudado em uma perspectiva processual. Em outras palavras, o autor
propõe um tipo de análise que concebe a totalidade complexa como estando
condensada nas partes que a compõe, ou seja, o todo permanece presente
em cada unidade decomposta, o que ele expressa ao enfatizar que
“subtendemos por unidade um produto de análise que diferente dos
elementos possui todas as propriedades que são inerentes ao todo e,
concomitantemente, são partes vivas e indecomponíveis dessa unidade”
(2001, p. 8).
Em oposição à
psicologia associativa (de que o conhecimento procede de conexões
associativas, sendo o conceito aprendido como algo acabado) e em
oposição à psicologia estrutural (que procurava descobrir os elementos e
os modos de suas composições, indo das partes para o todo), Vigotski
defende que o todo precede as partes, pois a totalidade permite a
síntese dos elementos, mesmo que contraditórios, de modo a criar a
unidade na diversidade, o que Gerken (1999) aborda com clareza ao dizer
que
na medida em que se
coloca como essencial o estabelecimento de uma relação de determinação
entre a totalidade e as partes do fenômeno. O todo é que precisa ser
explicado, é a sua gênese que precisa ser colocada no centro das
atenções metodológicas. No entanto, a apreensão da totalidade não se dá
imediatamente. É necessário construir uma unidade de análise que
contenha dialeticamente a totalidade e as partes, que seja passível de
uma abordagem empírica. O todo a perseguir será algo que articule a ação
humana, o pensamento e a linguagem, que explique a constituição do
sujeito a partir de sua inserção nas relações sociais e na cultura (Gerken,
1999, pp. 61-62).
Isso fica claro na
discussão de Vigotski (2001) sobre a linguagem, ao defender que “a
palavra nunca se refere a um objeto isolado, mas a todo um grupo ou
classe de objetos. Por essa razão, cada palavra é uma generalização
latente, toda palavra já generaliza e, em termos psicológicos, é antes
de tudo uma generalização” (idem, p. 9). Generalizar as palavras para
novos objetos constitui um ato do pensamento, porém o significado
pertence à palavra, expressa em linguagem e pensamento, pois “sem o
significado a palavra não é palavra, mas som vazio. Privada do
significado, ela já não pertence ao reino da linguagem” (idem, p. 10).
Mead (1967) também parte de pressupostos
semelhantes no desenvolvimento de sua análise do ato social.
O autor compreende ato social como a
atividade coordenada de um grupo de organismos para atingir um mesmo
fim, estendendo-o para a experiência humana. O que diferencia sua
abordagem das clássicas análises do comportamento, de base positivista,
é sua recusa de que a compreensão do ato social pode ser feita a partir
da soma dos atos isolados que o compõe. Portanto, segundo a perspectiva
téorico-metodológica meadiana, devemos buscar o sentido do ato social, o
conjunto de atos que compõe uma totalidade portadora de significações, e
não do ato isolado em si. Na mesma lógica de raciocínio de Vigotski,
entende Mead que a unidade do ato social deve ser buscada em um conjunto
de significações sociais que mediam as ações dos indivíduos na interação
face a face.
Nesta perspectiva, Mead (1967) concebe que a mais completa significação
do ato social envolve compreendê-lo enquanto relação social que condensa
elementos de uma totalidade social. Assim sendo, a compreensão dos
sinais, gestos e falas dos sujeitos participantes no ato social não
decorre da simples observação das ações dos indivíduos interatuantes, em
díades ou grupo, mas de seu embricamento com um mundo mais amplo de
relações sociais, a lhes oferecer significação para a realidade
experienciada Mead nos faz ver que o ato social só pode ser analisado,
na sua devida complexidade, quando considerado no fluxo de relações
sociais do fluxo de comunicação do qual ele participa. Cada ato está
ligado a um todo de relações sociais, do qual não pode ser dissociado
sem perder sua significação, pois envolve muito mais do que está
incluído na expressão verbal e gestual de quem o emite.Para o autor, o
ato isolado não tem sentido para a análise, pois todo ato implica
aqueles que o antecedem e todos os que o sucedem (Sant’Ana, 2002,
2004b).
Para Vigotski e Mead
o núcleo que organiza todas as propriedades envolvidas no fenômeno da
articulação pensamento e palavra, linguagem e experiência, é o processo
de atribuição de significado, no aqui e agora da experiência social ou
no processo posterior de elaboração do vivido, permitido pela capacidade
reflexiva. Para os autores, somente é possível para a psicologia
entender o pensamento, a consciência e ação dos sujeitos sociais a
partir da análise das significações sociais que perpassam a experiência
do sujeito no mundo, em dados momentos de sua história.
Tanto em Mead quanto
em Vigotski, a relação do sujeito com o mundo social ocorre mediada pela
linguagem, nascida e aperfeiçoada na e pela interação social. É no
interior desse processo que o sujeito, e as suas relações com os objetos
(pessoas, coisas e palavras) se constitui e é constituído. A linguagem
cumpre o papel de mediadora do encontro do indivíduo com o mundo de
relações sociais que o circunda e o envolve, de modo a referenciar a sua
ação sobre os objetos, a produzir uma teia de significações orientadora
de suas condutas. Joas (1985) enriquece essa discussão ao afirmar que
a inovação na teoria
de Mead sobre a constituição do objeto surgiu, pois, quando ele
descobriu que a cooperação da mão e do olho cria ‘coisas’, objetos
permanentes, somente quando a capacidade para tomar o lugar de outro,
que se desenvolveu na interação social, é também utilizadas nas tarefas
individuais com objetos não sociais (Joas, 1985, p. 153).
Desse modo, para Mead a relação com o objeto é sempre
mediada por um terceiro - o outro, a linguagem - pois o processo de
formação do sujeito não se resume à relação da consciência consigo mesma
e à atividade subjetiva da inteligência. Isso significa que no processo
de formação humana, a interação estabelecida com o objeto torna-se uma
interação mediada socialmente. Essa posição também comparece em Vigotski,
ao dizer que “o caminho do objeto até a criança e desta até o objeto,
passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o
produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas
ligações entre história individual e história social” (Vigotski, 1998,
p. 40).
No processo de
socialização humana, pessoas significativas mediam a ação da criança
sobre o mundo, através do uso de gestos e palavras, buscando oferecer
ordem, direção e estabilidade para o comportamento infantil (Berger e
Luckmann, 2002). As significações da experiência caminham de um
predomínio da linguagem gestual para a verbalizada que, uma vez
internalizada, permite que a criança possa se tornar sujeito e objeto de
si mesma, condição necessária à capacidade reflexiva. Ao discutir a
linguagem, a teoria de Vigotski se aproxima muito da de Mead, pois, para
aquele, a fala
além de facilitar a
efetiva manipulação de objetos pela criança, controla, também o
comportamento da própria criança. Assim, com a ajuda da fala, as
crianças, diferentemente dos macacos, adquirem a capacidade de ser tanto
sujeito como objeto de seu próprio comportamento [...]; b) permite a
descrição e análise da situação, que vai assumindo o caráter de
planejamento, expressando possíveis caminhos para a solução de problemas
(Vigotski, 1998, p. 36).
Em síntese, a
linguagem, para ambos autores, é um meio de comunicação intersubjetiva e
um mecanismo de controle do próprio comportamento em diferentes
situações, permitindo ao indivíduo agir e ao mesmo tempo refletir sobre
o que está fazendo. Os autores esposam a convicção de que as interações
sociais, condensadas em linguagem, formam o meio para a concretização
sociocultural do devir humano e que uma análise confiável da atividade
humana não deve principiar pelos fenômenos da consciência, mas sim pelo
agir mediado pelas expressões lingüísticas. Portanto, a linguagem media
a experiência intersubjetiva em um processo dinâmico que organiza e
transforma as partes em interação. Isto é, ao compartilharem
experiências articuladas pela linguagem, os indivíduos constroem sua
compreensão do real ao mesmo tempo em que se localizam em um mundo
sociocultural, criando um conjunto de significações sociais da
realidade.
A psicologia social
de Mead
Mead busca
lançar os fundamentos de uma nova compreensão da razão, do ser humano e
da sociedade. O foco principal de sua proposta consiste na substituição
do paradigma da consciência pelo da linguagem, que tem como foco a
intersubjetividade. A racionalidade não se atrela a uma razão solitária
como imaginou Descartes e toda a filosofia moderna, mas à relação
intersubjetiva da qual emerge, por conseguinte, a individuação no
interior do processo de socialização (Sass, 2004; Habermas, 1990).
No
paradigma da filosofia da consciência, especialmente em Fichte, segundo
Habermas (1990) a individuação depende da auto-referência, de uma
consciência que pode arbitrar sobre as coisas de si e do mundo, mas que
se vê impedida de autonomia pelos processos heterônomos que a cercam.Mead
se desvencilha do paradigma da consciência (ou do sujeito), que coloca a
questão da auto-referência como possível só quando o indivíduo reconhece
que a sua autonomia e sua independência dependem de um outro, que lhe
impõe expectativas e exigências, delimitando, em maior ou menor grau, as
suas possibilidades de liberdade; experiência de alteridade que, para
Fichte, é cerceadora da autonomia. Este autor, conforme Habermas (1990)
pensa o outro apenas como uma agência de controle diante do sujeito, de
modo que o eu precisa ser negado para o que o outro, enquanto
representante de uma ordem moral, possa se afirmar contra aquele
Em Mead, o
sujeito cognoscente, no processo de conscientização de si mesmo, só
atinge a percepção de si ao se tomar inevitavelmente como um objeto, o
que requer a intersubjetividade (Habermas, 1990), porém, a experiência
da alteridade não se resume à possibilidade de cerceamento da liberdade,
pois só incorporando as pautas valorativas atualizadas por outros
significativos se torna possível a crítica em relação ao instituído, a
produzir na ação do sujeito uma tensão entre o instituído e o
instituinte, na interação social. A interiorização desse outro, favorece
uma capacidade contínua tanto para legitimar quanto para colocar em
duvida as significações das experiências, mediatas ou imediatas,
mediante a comparação, a análise crítica, a reconsideração, etc.
O sujeito não atinge a consciência de si mesmo
(autoconsciência) a partir das atividades subjetivas do eu, a definirem
as atividades que o singularizam com isenção de mediações objetivadoras,
pois, como reflete Mead (1967), a subjetivização crescente do indivíduo
depende da interiorização
das instâncias externas ao eu, de maneira a
oferecem ordem, direção e estabilidade para o comportamento (Berger e
Luckmann,2002). Mead (1967) retoma a questão da individualidade a partir
de seu conceito de self, ao refletir o indivíduo como sujeito e
objeto ao mesmo tempo. Traz da filosofia da consciência, um conceito de formação humana que requer a experiência intersubjetiva
nascida dos processos de transação de um ego com um alter,
mas colocando em relevo a importância da linguagem no processo dialógico
em que um ego é interpelado por outrem, que o nomeia, dizendo,
por múltiplas linguagens (gestuais e verbais), quem é ele e as suas
possibilidades de ser no mundo. O outro oferece uma estrutura de
plausibilidade para a experiência, a oferecer significações para as
experiências vividas, postas como realidade objetiva, principalmente no
processo de socialização primária, ocorrida na infância (Berger e
Luckmann,2002).
A
teorização meadiana supõe que ser sujeito de si mesmo exige uma
autoconsciência que reflete suas experiências com autonomia e, para
isso, precisa de referências outras que não o si mesmo. Precisa
colocar-se em uma perspectiva objetivante, dada pela experiência da
alteridade, o que significa um certo distanciamento de si, de modo a
permitir se olhar como um objeto. Isso aparece na discussão feita por
Mead (1967) sobre o surgimento de uma instância psíquica (aquela que
permite ao si mesmo se olhar como um objeto), o self e sua
dependência de um outro generalizado.
Para que essa organização cognitiva, o
self, se desenvolva no indivíduo, ele precisa de uma experiência
intersubjetiva denominada role-taking, ou seja, adentrar no papel
do outro no esforço de apreender a realidade social em que ambos estão
inseridos. Colocar-se no lugar de outrem, pela assunção de seus papéis,
na infância, ou pela capacidade abstrata de descentração de si mesmo, é
a dimensão mais significativa na formação da subjetividade. Esta nasce
entrelaçada aos outros significativos, representantes da coletividade
social pois é, por meio da assunção dos papéis dos outros
significativos, que o indivíduo vai ganhando consciência de si
mesmo, ampliando sua perspectiva quanto à rede de relacionamentos
inter-subjetivos, ao mesmo tempo em que interioriza as atitudes que
compartilha com outros. O outro generalizado é uma abstração dos
elementos comuns das atitudes daqueles com os quais o indivíduo
interage, que, uma vez incorporado pelo indivíduo, passa a exerce
autocontrole dentro da estrutura de ordem normativa com a qual se
identifica.
Desse modo, a consciência de si,
denominada por Mead (1967) autoconsciência, supõe os processos de
exteriorização e interiorização do mundo objetivo; em um primeiro
momento, na interação face a face, e, posteriormente, por meio da
competência abstrata de adentrar em experiências distantes espacial e
temporalmente da imediaticidade cotidiana, possibilitando a entrada em
diferentes domínios da realidade.
A psicologia
social de Mead concebe a mente como mais
inclusiva do que o self, por ele escolhido para teorização, na
medida em que aquela apresenta elementos não conscientes em sua
composição, enquanto que o self, como objeto de análise, se
refere aos aspectos cognitivos e conscientes (Sant’Ana, 2002, 2004b). A
mente e a autoconsciência aparecem como a experiência mais peculiar da
raça humana, de modo que, sem uma compreensão processual das interações
sociais, é impossível entrar neste domínio humano, já que a mente não é
alguma coisa que está dentro do cérebro.
A mente é mais
inclusiva do que o self teorizado pelo autor, pois envolve a
dimensão inconsciente da experiência humana, muito embora consciência e
mente pertençam, ao mesmo tempo, ao domínio social e cognitivo.
Com base em entendimento semelhante, Farr (1998) concebe que a obra de
Mead
é uma resposta
deliberada à distinção estabelecida por Wundt entre sua Völkerspsychologie e sua psicologia fisiológica. Mead demonstra como
o indivíduo igualmente, é um fruto da interação recíproca de muitos. Ele
resolve a antítese wundtiana inserido o self entre a mente e a
sociedade (Farr, 1998, p. 62).
A linguagem aparece
como um objeto importante na Völkerpsychologie de Wundt, a
exercer uma influência considerável na lingüística na virada do século
XIX para o século XX. Segundo Farr (1998) Blumenthal (1973) (1) é
enfático na defesa de que
Para entender a
história da psicolingüística tanto quanto da psicologia em geral,
deve-se tentar seriamente entender Wundt e sua época. Ele foi o único
psicólogo vivo a exercer uma significativa influência sobre os
lingüistas de seu tempo. Suas conferências sobre psicologia da linguagem
eram as mais procuradas do mundo, e tiveram entre seus ouvintes
Saussure, Paul Delbrück e Bloomfield. A maioria dos quais realizaram o
estudo da linguagem nas décadas próximas à virada do século foram
orientados por ele, ou tiveram que levá-lo em consideração em seu
trabalho (citado por Farr, 1998, p. 65).
Farr (1998) considera
correto que Blumenthal (1973) chame a atenção para que os lingüistas
tratem corretamente o significado histórico de Wundt no desenvolvimento
dessa disciplina. Nessa história se insere Mead (1967), que afirmou ter
incorporado de Wundt, a idéia do gesto na comunicação enquanto parte do
ato social que se torna, mais tarde, um símbolo significativo, porém
buscando avançar na teorização o que o conduz de uma filosofia da
consciência para uma filosofia pragmática da linguagem que rompe com o
dualismo cartesiano. Segundo Mead, para Wundt, os gestos fazem parte de
um complexo de atos em que as diferentes formas estão envolvidas, se
tornando as principais ferramentas através das quais as formas (humana e
animal) respondem. Embora concorde com esta posição, Mead se opõe a
concepção wundtiana de que o self é anterior ao processo social,
preexistindo às experiências sociais, estando circunscrito, portanto, ao
corpo biológico. Mead (1967, p. 50) recusa esta idéia, defendendo que “o
corpo não é um self, enquanto tal, ele se torna um self só
quando se desenvolveu uma mente dentro do contexto da experiência social”,
o que supõe um processo de desenvolvimento engendrado de fora. Portanto,
“para Wundt, a linguagem era um produto da mente; para Mead, a mente era
um produto da linguagem” (Farr, 1998, p. 100). Desse modo, no
interacionismo social de Mead, a sociedade aparece como fundamental na
explicação do psiquismo humano, ao mesmo tempo em que são colocadas em
relevo as possibilidades do processo social de libertação do próprio
homem por meio da ação social.
As significações sociais
A psicologia social
de Mead (1967) coloca em evidência o processo de desenvolvimento do
self com base nas interações sociais das quais as pessoas
participam. Desse modo, o reconhecimento do outro e de si pelo outro são
fundamentais na formação do sujeito, pois há um núcleo intersubjetivo
visto que o processo de individuação do qual o self emerge
depende das redes de significações que atravessam as interações sociais
tornadas significativas (Habermas, 1990).
Mead concebe a
socialização como o processo, em que a experiência individual se
aproxima da organização da pauta geral de conduta do grupo social de
pertença. Desse modo, ação é a forma primeira de confrontação com a
realidade, permitindo, ao mesmo tempo, a formação da consciência, do
pensamento e da linguagem. Nesta perspectiva, agir é a condição primeira
para a constituição de um mundo humano, pois é por meio da ação
diferenciada que se constroem referenciais universais a orientar as
condutas dos indivíduos, ou seja, nascem as significações comumente
partilhadas.
Da teoria meadiana
(1967), podemos retomar a idéia de que o universo lingüístico é
imprescindível para a orientação das ações sociais dos seres humanos na
sociedade. Desse modo, as formas de diferenciação humana, engendradas no
contexto social, sempre remetem a uma configuração sociocultural própria
a cada momento histórico, que se relacionam com as possibilidades dadas
ao indivíduo em função de sua inserção em um determinado universo de
discurso. Nessa linha de raciocínio, Mead (1967), argumenta que a
posição de cada palavra depende do lugar que o objeto nomeado ocupa na
organização da experiência dos diferentes grupos sociais que a utilizam,
e que as suas significações devem ser buscadas em cada universo de
discurso:
O gesto
significativo, ou símbolo, sempre pressupõe em sua significação o
processo social de experiência ou comportamento do qual surgiu; ou como
dizem os lógicos, um universo de discurso está sempre presente com o
contexto dentro do qual gestos ou símbolos significativos adquirem, de
fato sua significação. Esse universo de discurso é formado por um grupo
de indivíduos realizando e participando de um processo social comum de
experiência e de comportamento, dentro do qual aqueles gestos ou
símbolos têm a mesma significação, ou significação comum, para todos os
membros daquele grupo (...). Um universo de discurso é simplesmente um
sistema de significações comuns ou sociais (Mead, 1967,
p. 89).
Portanto, a compreensão do conjunto de atos
(sinais, gestos, falas) de um grupo se torna impossível “fora dos
quadros da experiência prática e dos universos de discursos em que se
circunscrevem os sujeitos” (Ziolkowski, 1997, p. 23). Isso significa que
a constituição do sujeito exige o interagir com o outro, as coisas, e,
dessa forma, com uma realidade determinada historicamente a lhe oferecer
uma estrutura de plausibilidade para a experiência vivida (Berger e
Luckmann, 2002). Compreender a formação do sujeito
remete ao processo dialético de
entrelaçamento entre a exteriorização e interiorização da realidade
subjetiva e objetiva na formação humana, pois a subjetividade
só pode existir na relação com instituições
sociais a oferecerem significações sobre os objetos, pessoas, relações
sociais que são a própria condição de existência da sociedade e dos
sujeitos sociais.
Para o autor, as
significações nascem de um entendimento compartilhado no interior de
diferentes situações de interação entre os indivíduos, o mesmo ocorrendo
com as regras de ordenamento da vida social. E, uma vez
instituídas, tais significações e tais regras, estas entram na
comunicação lingüística e passam a preceder a dinâmica interacional
proporcionando representações antecipadas das situações.
Quando falamos em
significações sociais estamos nos referindo ao processo de atribuição de
sentido para as sinalizações corporais, gestuais e vocais, que
comparecem no ato social. Para Mead as significações emergem de um
processo de comunicação, por meio de uma conversação de gestos, que uma
vez compartilhada e incorporada pelos sujeitos em interação, prenuncia
uma resposta apropriada, ao invocar em situações idênticas ou similares,
aquele ato social originário em que uma dada significação emergiu no
processo grupal. Uma vez forjadas, as significações sociais se tornam
uma parte inseparável da experiência individual e coletiva, pois “a
análise da conversação de gestos significantes mostra que o ato social
engendra o campo da significação” (Sass, 2004, p. 194). Posteriormente,
com a emergência do signo, as significações extrapolam a comunicação
corporal, face a face, envolvendo relações mediadas por significantes.
A
teoria meadiana afirma, assim, a constituição e expressão do indivíduo
na e pela interação social, permitindo a análise das relações sociais
através da observação de várias situações de interação. Como a formação
do indivíduo se constitui e se afirma na dinâmica interacional, a
mediação da linguagem, dos gestos e da fala, condensada em símbolos, tem
um papel imprescindível no interior do processo de constituição do
sujeito. A mediação da linguagem falada não só amplia as possibilidades
de enriquecimento das relações sociais, mas também a capacidade de
controle entre os seres humanos e deles sobre a natureza. A linguagem
complexifica a experiência humana ao edificar contextos normativos que
“determinam a quantidade de todas as referências interpessoais tidas
como legítimas num mundo da vida compartilhado intersubjetivamente. Ao
iniciar uma relação interpessoal com um ouvinte, o falante, enquanto
ator social, refere-se simultaneamente a uma rede de expectativas
normativas” (Habermas, 1990, p. 224).
A base da teoria de
Mead (1967) é a consideração de que interação é conversação gestual mediada ou não pelo verbo, de modo a permitir o despertar de colaboração
entre indivíduos a conformar um ato social. Na gênese do ato social, os
indivíduos fazem uso da ação corporal ou vocal (gritos, choro, ruídos,
bramidos), a ganhar paulatinamente significação através da constante
interação, tornando-se gestos significativos em meio à complexidade do
contexto em que o ato se inscreve (Sant’Ana, 2002). O gesto vocal (o
grito, o choro, o bramido, o balbucio) se torna um símbolo significativo
quando há concomitância na emissão dos gestos por parte de um ego e a
sua interpretação por outros, a sinalizarem uma ação social
compartilhada. Nesse interjogo de sinalização e interpretação, os
indivíduos organizam seus movimentos gestuais e vocais a engendrarem o
ajustamento das condutas individuais em uma ação partilhada
intersubjetivamente. O ato social passa a ter o mesmo sentido tanto para o indivíduo que emite uma ação quanto para o indivíduo que o
recebe e responde explicitamente a ele. Habermas (1990) enfatiza que o
gesto vocal, quando ganha significação, torna-se um sinal de modo que “o
estímulo transforma-se num portador de significados” (p. 211), visto que
“para assumir a si mesmo diante da perspectiva de um outro participante
da interação e tornar-se consciente de si mesmo enquanto objeto social,
o ator precisa apropriar-se do significado objetivo de seus gestos
sonoros, que são igualmente estimulantes para ambos os lados” (idem, p.
211).
Mead nos leva a
considerar que a vida na sociedade humana exige que o indivíduo tome
como referência, na organização de suas relações sociais, as atitudes de
outros indivíduos no que diz respeito aos processos sociais e aos
funcionamentos institucionais. A entrada do sujeito em um dado universo
de discurso (2) só se torna possível, segundo Mead, quando os indivíduos
tomam para si as atitudes de outros, pois, no processo de formação do
sujeito, os outros significativos oferecem modos de pensar o real e de
organizar a cognição e a afetividade.
Destarte, o
pensamento, conforme Mead, envolve um sistema de significações
partilhadas no interior de um universo de discurso, que nascem do campo
da experiência direta do sujeito com os outros indivíduos significativos
de seu universo sócio-cultural de referência, a linguagem trazendo o
outro para dentro de si.
A conversação
gestual, do ponto de vista filogenético, tem um estatuto pré-reflexivo
na teoria meadiana, já que ela também é comum aos não humanos. Portanto,
os seres vivos compartilham com os humanos a condição de resposta às
sinalizações gestuais próprias à interação face a face. Porém, só o ser
humano tem a condição antropológica para o desenvolvimento de um self,
a envolver uma distinção entre um eu e um mim, de modo que
o primeiro é concebido por Mead (1967) como a fase do self que
se exterioriza, em resposta as atitudes dos outros, enquanto o segundo
é a fase do self que interioriza aquelas atitudes. O self funciona no mundo pondo em relação sempre essas duas dimensões. Muito
embora só em um plano ideal seja possível separar, a ação de cada um
desses agentes, Mead (1967) enfatiza as peculiaridades e a posição
ocupada por cada um deles na formação do self.
A capacidade de
interiorização do social, própria ao mim, faz dele o depositário
das normas sociais da comunidade, tratando-se, portanto, de uma
condensação pelo self de convenções sociais, que fixam
determinados limites à ação do indivíduo; a capacidade de exteriorização
no social, própria ao eu faz dele o impulsionador das ações, a
favor ou contra as pautas sociais já instituídas. Portanto, Mead trata a
questão da formação do self em termos de uma relação dialética entre o Mim (o conjunto organizado de atitudes de outros que alguém assume por si
mesmo) e
o Eu (a resposta do indivíduo à atitude de outros).O eu, assim, é um
movimento da subjetividade que pode se opor ao mundo institucionalizado,
ao mesmo tempo em que os anseios, impulsos e expressões do indivíduo têm
de considerar as normas sociais, quer seja para orientar de uma forma
socialmente reconhecida essas potências subjetivas, quer seja para
subverter os códigos normativos da sociedade.
Mead (1934/1967)
percebe na brincadeira e no jogo infantil mecanismos de adoção do papel
do outro, em que a criança se coloca no lugar dos outros e pode permitir
experimentar, a seu modo, o lugar ocupado pelas pessoas no mundo
sociocultural. Com isso, ela ativamente vai entrando em relação com
diferentes conteúdos simbólicos, a permitirem a significação e a
ressignificação das experiências vividas. Na fase da brincadeira ela se
desloca para um papel por vez, mesmo que ocupe vários papéis
sucessivamente, enquanto na fase do jogo ela consegue perspectivar a
assunção de vários papéis ao mesmo tempo, internamente, na decisão de
como agir, de que papel assumir. Nesta fase se torna perceptível a
relação de um mim, enquanto depositário de conteúdos culturais
incorporados pela criança, capaz de dar direção e controle ao seu
comportamento, com um eu que deve agir buscando respostas
adequadas à situação. A situação do jogo coloca em ação uma relação
entre o incorporado do mundo sociocultural, por meio da mediação do
outro, e as expectativas postas pelos diferentes outros para a criança,
que deve buscar ajustar as sua perspectiva para a ação no aqui e agora.
Self e sociedade
A leitura que Honneth (2003) faz de Mead reflete que o movimento de
reconhecimento pelos sujeitos sociais advém de forças engendradas
por camadas incontroláveis de um dos componentes do self, o Eu,
em sua busca do reconhecimento do direito de agir de modo mais livre e
espontâneo, por outro generalizado. No processo histórico
os sujeitos, sob a pressão de seu Eu, são compelidos a
deslimitação contínua das normas incorporadas no outro generalizado,
eles se encontram de certo modo sob a necessidade psíquica de engajar-se
por uma ampliação da relação de reconhecimento jurídica: a práxis social
que resulta da união de esforços por um tal enriquecimento da
comunidade é que se pode chamar, na psicologia social de Mead, “luta
por reconhecimento” (Honneth, 2003, p. 145).
Nesta perspectiva, podemos refletir que a autorealização implica em um
movimento pelo reconhecimento social das capacidades e
propriedades singulares do sujeito, a convencê-lo de seu valor para o
meio social, por um outro significativo ou generalizado. Porém, o
reconhecimento da singularidade não se resume em assumir as expectativas
morais do outro generalizado, pois, desse modo ele só pode ser
reconhecido como um cidadão responsável por atos morais imputáveis,
obrigação de todos os membros da sociedade. O sujeito quer mais que
isso, visto que, conforme Honneth (2003)
a espécie de confirmação de que depende um tal
sujeito não pode, por isso, ser aquela que ele encontra como portador de
direitos e deveres normativamente regulados; pois as propriedades que
lhe são adjudicadas como pessoa de direito, ele as partilha justamente
como todo os outros membros de sua coletividade. Em oposição a isso,
porém, o “Me” da autorealização individual requer poder entender-se a si
próprio como personalidade única e insubstituível; nesse sentido, essa
nova instância refere-se a um órgão de autocertificação ética que contém
as convicções axiológicas de uma coletividade, a cuja luz um sujeito
pode certificar-se da importância social de suas realizações individuais
(Honneth, 2003,
p. 148).
Na criança em desenvolvimento, o reconhecimento de que ela vive na
interação afetiva com o outro significativo tem de ser generalizada
enquanto uma confirmação intersubjetiva mais ampla, de modo a fortalecer
as significações da experiência geradas pela primeira instância de
certificação ética, na medida a criança entra em novas redes de
parceiros de interação (Honneth, 2003). A criança precisa de uma
certificação ética, compartilhada, dos parceiros mais significativos de
suas redes de interação, o que exige dela compreender os valores
compartilhados pelas pessoas para, a partir daí, identificar
possibilidades de expressão de sua singularidade e os canais de busca e
manutenção de reconhecimento. Nos diz o autor que
para poder chegar a um “Me” que opere semelhante resseguro ético, todo
sujeito têm de aprender a generalizar a tal ponto as convicções
axiológicas de todos os seus parceiros em interação, que ele acaba
obtendo uma representação abstrata das finalidades comuns de sua
coletividade, pois só no horizonte desses valores partilhados em comum
ele é capaz de conceber a si mesmo como uma pessoa que se distingue de
todas as demais ao trazer uma contribuição, reconhecida como única, para
o processo da vida social (2003, pp. 148-149).
Uma vez
formada no sujeito a capacidade de se colocar no lugar do outro, base da
reflexividade que caracteriza o self, se torna possível uma
relativização em relação às significações que o outro lhe propõe
compartilhar. Para se individualizar, no sentido de trazer uma
contribuição singular para a vida social, o sujeito precisa conhecer
pautas de condutas instituídas para que possa ultrapassá-las ao criar
algo de novo, a distinguí-lo dos demais
A leitura de Honneth
(2003) evidencia um atrito interno do eu com o mim,
expresso em uma tensão que representa “as linhas gerais do conflito que
deve explicar o desenvolvimento moral tanto dos indivíduos como das
sociedades” (p. 141), pois o sujeito procura ampliar as normas
convencionais do mim com vistas à expressão criativa e impulsiva
próprias à individuação, o que produz um conflito moral. Honneth (2003)
concebe que, na teorização meadiana, as divergências morais entre o
eu e o mim funcionam como alavancas históricas promotoras de
ampliação de relações de reconhecimento articuladas ao processo
progressivo de individuação, pois
Uma vez que os
sujeitos, mesmo após a efetuação de reformas sociais, só podem defender
as exigências de seu “eu” antecipando uma coletividade que concede mais
espaço para liberdade, origina-se uma cadeia histórica de ideais
normativos que apontam na direção de um crescimento da autonomia pessoal
(Honneth, 2003, p. 14).
Desse modo, nas
provocações promovidas pela experiência social, o eu e o mim não têm apenas a possibilidade de atrito mas também, de uma
permanente dialética em relação à alteridade, visível na brincadeira
infantil, quando a criança diz: - antes eu era minha mãe, agora eu sou
eu. Mais tarde, essa dialética ora nos permite distinguir o que é do
outro e o que é nosso, ora não permite tal distinção. Ou seja,
autoconsciência se apresenta como sendo um si mesmo que porta um outro,
cuja alteridade se acentua ou se abranda em muitos momentos.
Do distanciamento
crítico em relação aos outros significativos e ao outro generalizado, o eu pode ampliar o outro generalizado de sua comunidade,
estendendo as possibilidades de autonomia para todos na mesma condição
social. É assim que movimentos instituintes se colocam em oposição ao
instituído, ampliando a democracia e a liberdade de expressão, no
interior da ordem existente ou no embate por uma nova sociedade.
A significação das
experiências de si, do outro e do mundo é mediada por formações
sócio-culturais, que criaram regras, normas e valores, que se tornam
objeto de negociações sociais, que, por sua vez, podem transformar essas
formações (Bronckart, 2003). Essas formações permitem que o
desdobramento concreto da atividade interativa seja modulado, oferecendo
às pessoas uma interpretação dos contextos e das possibilidades de ação
franqueadas por cada um deles. Por isso, na interação face a face, os
referenciais sócio-culturais que mediam a ação dos sujeitos, aparecem em
meio aos seus referenciais próprios, estabelecendo um nível de
comunicação complexo, ou seja, as significações próprias do sujeito são
forjadas por uma cultura em que se localiza o seu subuniverso cultural,
em contato com a sua memória e sua história.
Bronckart (2003)
reconhece que não há comunidades verbais homogêneas, pois cada uma delas
é constituída por múltiplas formações sociais, que, “em função de seus
objetivos e interesses particulares, elabora modalidades particulares de
funcionamento da língua” (p.36-37). Nesta perspectiva a linguagem é
estabelecida e subordinada aos diferentes planos da vida social, gerando
formas variadas de atribuição de significação à realidade, visto que as
“comunidades verbais são atravessadas por organizações diversas,
complexas e hierarquizadas, no quadro das quais, permanentemente se
desenvolvem relações de força e conflito entre grupos sociais com
interesses divergentes” (idem, p. 36). Isso significa que os sujeitos
são expostos a múltiplas referências socioculturais, mediatas e
imediatas, porém se localizam em função de suas diferentes pertenças
grupais e de sua incorporação própria de elementos que ele, ativamente,
captura de uma teia de significações sociais a envolvê-lo.
Bronckart (2003)
enfatiza a compreensão de que com o desenvolvimento da abstração,
tornar-se-á possível o desenvolvimento das trocas e comparações entre concepções e práticas de origens culturais diversas. A aposta
meadiana, é de que as experiências do sujeito permitam uma certa
autonomização do funcionamento do pensamento, que o capacite a
significar e ressignificar as palavras e as coisas, o que parece
constituir a condição necessária para que a pessoa possa intervir
verdadeiramente no processo de desenvolvimento dos seus grupos mais
significativos de pertencimento; que o sujeito não se limite a uma
simples reprodução das aquisições culturais de origem, mas que
compartilhe ativa e criticamente o processo coletivo de realização de
construções coletivas.
Mead nos faz
compreender que, no plano da autonomia do sujeito, esta pode ser
ampliada pelas ações no espaço público, no campo do exercício do direito
- no sentido da mudança nas normas para garantir a liberdade de
expressão e reconhecimento social de novas identidades sociais e
políticas. O reconhecimento do sujeito à diferenciação pessoal e grupal,
tanto quanto a sua liberdade de afirmação como
membro de um grupo social qualquer, também depende de um reconhecimento
intersubjetivo mais amplo, que transcende o seu grupo de pertença. Uma
comunidade mais ampla deve reconhecer a liberdade do indivíduo e seu
grupo assumir qualquer identidade, desde que a afirmação dessa
identidade não exija a destruição de outras com os quais esse grupo se
antagoniza. É isso que permite um self realizar-se na sua
identidade pessoal, social e política.
Entendo que quando Mead fala no distanciamento relacional
do indivíduo em relação aos outros significativos, com o nascimento da
abstração, ele afirma a possibilidade de cooperação indireta entre os
indivíduos, a não requerer a interação face a face. A partir de Mead,
podemos refletir que a capacidade reflexiva implica no esforço da
colocação das relações humanas como relações sociais autônomas, que
guardam uma certa distância para com os indivíduos que delas participam.
Se o pensamento não precisa mais da ação sobre o objeto para construir
uma significação sobre as coisas e sobre as relações humanas, a esfera
pública passa a ser importante não apenas para os setores organizados
que dela participam mais ativamente, mas também para aqueles sujeitos
localizados fora dela e por cuja capacidade reflexiva podem entender e
tomar posição sobre os movimentos que ali ocorrem.
A experiência do jogo, em Mead (1967),
apresenta-se como facilitadora para a formação de um sujeito mais ativo
e mais autônomo, na medida em que ajuda o self a configurar uma
organização processual que se movimenta com flexibilidade ao lidar com a
pluralidade de experiências trazida pela vida social, pois permite ao
sujeito adentrar em diferentes universos de discursos e ação e
compreender as significações que neles transitam. Desse modo, as competências sociocognitivas obtidas na esfera do jogo podem ser base
para o dinamismo em outras esferas da vida, pois pela interpretação,
coletiva solitária ou das experiências sociais, os indivíduos pode
encontrar canais para a criação social e política de significações e
práticas não circunscritas aos discursos dominantes.
Na
perspectiva meadiana a criatividade é a possibilidade de diálogo com o
vivido para produzir o novo. A ação social do indivíduo se inscreve em
uma rede de significações, que o leva a interpretar e reinterpretar as
suas experiências, retomando a sua ação e reintegrando-a a uma relação
específica com a vida social, em suas várias formas de organização
espacial e temporal.
Habermas (1990)
acentua que, em Mead, a esfera pública aparece como sendo o locus político onde indivíduos e grupos podem desenvolver ações de afirmação
de identidade, como subjetividades coletivas e individuais, na busca de
reconhecimento universal, não havendo, portanto, uma oposição entre a
busca de satisfação individual de reconhecimento e a negação dessa
possibilidade pela sociedade. O desenvolvimento de selves reflexivos, permitiria a cada um assumir a perspectiva dos
outros, em uma relação dialógica e não coercitiva, com vista à ampliação
da democracia e da liberdade na sociedade mais ampla. Trata-se de uma
teoria de socialização a conceber que “a individualização crescente
mede-se não somente pela diferenciação de identidades singulares,
mas também pelo crescimento da autonomia pessoal” (Habermas, 1990, p.
219), cuja possibilidade de realização precisa receber uma certificação
ética (Habermas,1990; Honneth,2003) para que as divergências morais não
sejam significadas como desvio da ordem vigente.
Mead (1967) teoriza a formação de sujeito na busca das
bases psicossociais da autonomia e da criação humana. O seu modelo de
comunicação reflete a ação social baseada em um reconhecimento recíproco
isento de coerção, a favorecer relações simétricas entre todos
envolvidos no processo dialógico, de modo a tornar-se possível por meio
do entendimento recíproco (de duas ou mais pessoas, grupos, etc.) a
solução de problemas comuns. Trata-se de um modelo de socialização e
individuação em que o desenvolvimento da interação social franqueia o
encontro livre e aberto à diversidade, na esfera pública, de
significações de determinadas experiências sociais entre grupos sociais,
rumo a uma comunidade dialógica universalizada, promotora de
reconhecimento social de subjetividades coletivas que expressam
sentimento de injustiça e privação social que afetam determinados
segmentos sociais.
Não compartilho dessa
visão na sua totalidade pois não penso que a interação social na esfera
pública pode promover a emancipação humana de todas as formas de
relações sociais promotoras de hierarquias discriminatórias e opressivas. Considero que uma
formação humana que forneça à pessoa a competência sociocognitiva de colocar-se no lugar dos
outros e reconhecer a legitimidade de determinadas demandas e a
ilegitimidade de outras, idealizada por Mead apresenta um potencial
emancipatório que não necessariamente se realiza, pois é uma garantia
insuficiente contra os processos sociais que colocam o sujeito em
condições de ameaça (desemprego, perda de moradia e condições de
sobrevivência, etc.). Assim, os múltiplos repertórios de esquemas de
ação de sujeitos ativos e reflexivos podem conduzir a resolução criativa
de conflitos, mas podem ser insuficientes em um momento histórico em que
a utopia se esvazia de sentido e em que o anonimato lhes aparece como a
relação social dominante.
Embora Mead valorize a ação social em todo processo de individuação,
deixa escapar as condições históricas de possibilidade de realização
desse ideal num plano universal. Nem todo momento histórico oferece
condições sociais favoráveis para reformas significativas no campo dos
direitos sociais e políticos, a possibilitarem a resolução critica das
privações historicamente constituídas, o que se liga, em alguma medida,
à dificuldade de oferta de certificação ética pela sociedade para
indivíduos e grupos que, no interior ou fora da arena pública, clamam
pela valorização social de suas vidas, pela salvaguarda de suas
identidades. Caso isso não fique claro, podemos cair numa concepção que
afirma a preeminência da vontade, quer no plano psicológico, quer no
plano coletivo, ou seja ceder à uma ética extremamente voluntarista da
relação indivíduo-sociedade, a responsabilizar as pessoas quanto às
relações de desigualdade e opressão existentes na sociedade.
Isso não significa
que esse ideal não possa ter um potencial emancipatório, a referenciar
grupos sociais nas suas lutas contra discursos e práticas que justificam
a manutenção de relações sociais de desigualdade, de opressão e de
manutenção de hierarquias sociais, promotoras de subjugação de um grupo
a outro, em qualquer domínio da vida social. Buscar a construção de uma
socialização voltada para ideais democráticos e éticos deve ser
compromisso de todos que ambicionam um mundo social pautado por relações
sociais mais democráticas e igualitárias. Assim, almejar que as
experiências formativas em pauta na sociedade favoreçam a expressão
social da luta pela atribuição de novas significações à realidade social
e, que, possam atingir as pessoas em períodos significativos da
constituição de suas significações mais importantes da experiência
social, no entrelaçamento e individuação e socialização, refletidos por
Mead (1967) e Vigotski (1998,2000, 2001), é algo que devemos ambicionar
o tempo todo, no esforço cotidiano de uma praxis social
transformadora.
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Notas
(1)
Blumenthal, A.L. (1973). Introdution. In: Wundt, W., The Language of
gestures. The Hague: Mouton.
(2) O autor define universo de discurso
como “sistema de símbolos universalmente significantes determinado
pela participação e interação comunicativa entre indivíduos” (1967, p.
157-158).
Nota sobre a autora
Professor Doutor do Departamento
das Psicologias da Universidade Federal de São João del-Rei e membro do
LAPIP (Laboratório de Pesquisa e Intervenção Psicossocial) do DPSIC/UFSJ. Graduação em Psicologia e
Ciências Sociais; mestrado em Sociologia na USP (Universidade de São
Paulo), na FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas);
doutorado em Psicologia Social na PUC (Pontifica Universidade Católica)
de São Paulo. Leciona Psicologia social e desenvolve um programa de
pesquisa denominado Interação social e formação da subjetividade na
educação escolar e no brincar.
Endereço eletrônico:
ruthbs@ufsj.edu.br.
Data de recebimento: 31/07/2006
Data de aceite: 30/10/2007
Memorandum 12, abril/2007
Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP
ISSN 1676-1669
http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/a12/santana01.htm