A escolha do tema (1)
foi-me sugerida não somente pelas visitas quase quotidianas aos textos de
Edith Stein, mas também por uma problemática fundamental que acomuna a
fenomenóloga alemã a Edmund Husserl, relativa à hilética
fenomenológica. Já me movi neste âmbito em algumas ocasiões
anteriores, ligadas a congressos organizados pelo Istituto Enrico
Castelli, e gostaria de citar os mais recentes: aquele sobre o tema da
encarnação (Ales Bello, 1999) e aquele sobre a questão da
intersubjetividade e teologia filosófica (Ales Bello, 2001). Naquelas
ocasiões, frisei a importância da hilética fenomenológica usando-a
como chave interpretativa dos fenômenos religiosos em sentido
específico. Na segunda contribuição, partindo de alguns textos
husserlianos sobre hilética, ampliei a base metodológica através de
integrações tomadas das obras de Edith Stein, a qual, quase única entre
os discípulos de Husserl, aqui e ali em seus escritos demonstra ter
aprendido a lição do mestre justamente quanto a relação entre noética
e hilética.
As dificuldades de abordar o tema
Teologia negativa e mística com a chave de leitura fornecida pela
hilética fenomenológica são muitas: consistem no fato de toda vez ser
necessário recomeçar da capo para indicar o terreno metodológico
sobre o qual se coloca, porque não se pode dar por óbvio o conhecimento
deste aspecto das análises husserlianas, freqüentemente ignorado pelos
não especialistas; além de se relevar oportuno proceder a um pessoal
ajuste de foco em nível interpretativo dos passos em que os dois
fenômenos citados abordam o argumento examinado; e, por fim, porque, em
cada circunstância, a aplicação é referida a temas que requerem que o
campo seja preliminarmente desembaraçado de preconceitos.
Exporei sinteticamente o
antecedente da pesquisa à qual quero me dedicar, para proceder mais
diligentemente ao reconhecimento do novo terreno de indagação.
A tese que gostaria de demonstrar
é a seguinte: a teologia negativa e a mística representam o
desenvolvimento da noética, por um lado, e da hilética, por outro; e
são compreensíveis com base na relação noética-hilética. Alguns
escritos de Edith Stein representam uma fonte preciosa porque servem para
delinear metodologicamente o significado da duplicidade
notética-hilética e fornecem um material igualmente importante para uma
reflexão sobre a teologia, na relação entre teologia afirmativa,
teologia negativa e teologia mística na esteira de Dionísio o
Aeropagita, e para uma indagação sobre a experiência mística, como é
testemunhado pelos comentários dela a Santa Teresa d´Ávila e a São
João da Cruz. Ainda que dando indicações muito válidas sobre noética
e sobretudo sobre hilética fenomenológica, Stein, todavia, não utiliza
tais instrumentos no sentido aqui proposto. Trata-se, portanto, de
aventurar-se em terreno até agora inexplorado.
Linhas essenciais da hilética
fenomenológica
A identificação das vivências
constitui a genial descoberta husserliana e o que caracteriza a sua
indagação. A análise das vivências mesmas, coloca em evidência a
duplicidade entre o momento noético intencional e o momento hilético ou
material. A descrição desta duplicidade já contida no primeiro volume
de Ideen zu einer reinen Phänomenologie und phänomenologischen
Philosophie (2) (cf. Husserl, 1913/1976) é
aprofundada no segundo volume (3) (Husserl,
1952/1976) em relação à análise do corpo vivo (Leib). O corpo
vivo não só tem localizações relativas às sensações sensoriais que
exercem uma função constitutiva para os objetos que aparecem no espaço
mas também tem localizações relativas às sensações de grupos
completamente diversos; e a exemplificação é particularmente eficaz
porque Husserl se refere aos sentimentos sensoriais, às sensações de
prazer e dor, de bem-estar corporal ou de mal-estar derivado de uma
indisposição corporal (4) e esse é um ponto
particularmente indicativo.
Que tal argumento continue
presente em suas pesquisas é confirmado por um notável número de
manuscritos dos anos Trinta dos grupos C e D, nos quais os dois momentos
acima indicados estão presentes. A função da hilética no campo da
sensação é particularmente estudada no Ms. Trans. D 18 a propósito da
formação do sistema cinestético que se refere à relação entre o
corpo próprio e as mudanças do mundo circunstante com referência ao
campo oculomotor. No Ms. Trans. D 10 I afirma-se que o sistema
cinestético se constitui em relação à constituição dos objetos
hiléticos (5). Mas, é no Ms. C 10 que se
colhe o nexo entre as unidades hiléticas e as afeições: o universo
hilético é não-egológico, se constitui sem a intervenção do eu,
porém "das Ich ist immer ‘dabei’ ", o eu está
sempre presente como lugar das afeições e sempre, de qualquer modo,
ativo (6).
Uma preciosa exemplificação
nesta direção está contida em um texto no qual certamente não se
esperaria encontrar semelhante aplicação: Der Aufbau der menschlichen
Person, que recolhe as aulas ministradas por Edith Stein no semestre
invernal de 1932-33 (Stein, 2000) no Instituto de Pedagogia Científica de
Münster. Trata-se de um texto no qual questões de caráter
antropológico e pedagógico são enfrentadas tendo intenção de chegar a
uma síntese entre os resultados das pesquisas fenomenológicas até
então conduzidas por ela e a contribuição do pensamento de Tomás de
Aquino sobre o assunto. Esta síntese se realiza de modo original;
enfrenta-se, de fato, o assunto, a Sache, utilizando o método
fenomenológico através do qual se avalia também a contribuição de
Tomás. As tomadas de posição deste último são filtradas pela lente
fenomenológica que faz passar apenas o que supera a prova de uma
sustentação de tipo anti-especulativo, indagando a coisa como se dá nos
limites em que se dá, segundo o "princípio de todos os
princípios" afirmado por Husserl (1913/1976) no § 24 de Ideen I.
Todavia não é isto o que nos
interessa, ainda que deva ser considerado para o enquadramento do livro. O
que permanece sempre evidente é a chave de leitura dos fenômenos, a
fenomenológica, claro, que se manifesta de modo surpreendente a
propósito de um argumento estritamente "clássico", o relativo
à alma como forma e espírito, onde a correlação entre os dois termos
remete por um lado à fonte tomasiana e por outro à husserliana. E
justamente refletindo sobre o tema do espírito, a autora afirma que o
mundo do espírito abraça o inteiro mundo criado.
Para demonstrar isso, Edith Stein
examina um bloco de granito. A seu ver, trata-se indubitavelmente de uma
formação material na qual, todavia, se revela um sentido; ela é cheia
de sentido, porque, ainda que não percebamos uma espiritualidade
pessoal, tal formação é constituída segundo um princípio estrutural
próprio, "são partes essenciais dela o seu peso específico, a sua
consistência, a sua dureza; também a massa, o fato que ‘se apresente’
em blocos enormes, e não em grãos ou fragmentos" (7)
(Stein, 1932-33/2000, p.166), mas o que é importante para nós e que vale
no plano das afeições das quais falava Husserl, consiste no fato que
"chama nossa atenção de modo singular". De fato, "Esta
irremovível consistência e esta massa não são somente algo que
acontece sob os nossos sentidos e que a razão constata como uma
realidade. Os sentidos e a razão são golpeados interiormente; neles,
algo se revela a nós; nesta realidade lemos algo" (Idem). O
"algo" que a este ponto vem a ser identificado não é somente
um sentido simbólico, que também está presente, mas eis que
emerge o momento hilético da vivência: "ele nos fala de uma
imperturbável estabilidade e de uma segura confiabilidade como qualidades
adequadas a ela" (Idem); a imperturbabilidade, a estabilidade, a
confiabilidade são ressonâncias interiores, dão um sentido de bem-estar
ou mal-estar (do qual falava Husserl a propósito do aspecto hilético da
vivência que não é o mesmo que pode ser suscitado pela argila ou pela
areia).
Para continuar a comparação com
as análises husserlianas e colher as assonâncias, às quais, na
referência recíproca entre eles, esclarecem os resultados a que os dois
fenomenólogos chegam é oportuno retomar alguns passos do texto
husserliano citado acima. Trata-se da referência àqueles grupos de
sensações localizadas de materiais, que cumprem um papel análogo ao de
materiais, justamente, os de sensações primárias para os Erlebnisse
intencionais, quais a dureza, a brancura etc.
Todos
estes grupos de sensações, enquanto sensações localizadas –
escreve Husserl – têm uma imediata localização somática, de
maneira que, para cada homem, competem de modo imediatamente intuitivo
ao seu corpo próprio enquanto seu corpo próprio, como uma
objetividade subjetiva que se distingue da coisa meramente material
corpo próprio através desta camada de sensações localizadas (8)
(Husserl, 1913/1976, p.547).
Estas últimas, "difíceis
de analisar e de ilustrar" – continua Husserl – "(...)
formam a base da vida do desejo, da vontade, as sensações de tensão e
de relaxamento da energia, as sensações de inibição interna, da
paralisia, da liberação" (Idem).
Com esta camada se conectam
porém as funções intencionais, as materiais assumem uma função
espiritual, assim como acima as sensações primárias sofriam uma
apreensão, vinham a fazer parte da percepção sobre as quais
depois se constituíam juízos perceptivos etc. (Idem).
Estas palavras podem encontrar
uma correspondência na seguinte afirmação de Stein (1932-33/2000, p
"Não existem, então, formações privadas de espírito; de fato, a
matéria formada é matéria permeada pelo espírito" (9).
O termo espírito pode ser entendido como aquele sentido das coisas que
tem a capacidade de manifestar-se gerando afeição em nós. Certamente a
este ponto da pesquisa E. Stein dá ao "sentido" ou ao
"espírito" uma acepção mais decisivamente ligada à forma
substancial do que Husserl.
Assim, delineia-se claramente a
relação entre hilética e noética, mas o momento hilético parece
arrastar o noético; daqui a peremptória afirmação husserliana: "a
inteira consciência de um homem é de certo modo ligada a seu corpo
próprio através da sua base hilética" (10)
(Husserl, 1913/1976, p.547), todavia a duplicidade não é eliminada. De
fato, os Erlebnisse intencionais não são localizados e não
constituem uma camada do corpo próprio. A autonomia do momento espiritual
em relação ao material que, no entanto, consente a manifestação é
assim replicada: "A percepção enquanto apreensão tátil da forma,
não está no dedo que toca, no qual estão localizadas as sensações
táteis; o pensamento não está, na verdade, localizado intuitivamente na
cabeça como as sensações são localizadas de tensão" (Idem).
Husserl observa que freqüentemente nos exprimimos assim, e podemos
perguntar-nos o por que isso acontece; poder-se-ia responder que a
atrativa da localização hilética faz com que a atenção se concentre
no corpo próprio. Aqui o termo hilética não está a indicar a matéria
no sentido tradicional mas um tipo novo de materialidade, já por ele
proposto no §85 do primeiro livro de Ideen (Husserl, 1913/1976),
onde ele está claramente à procura de um termo novo e crê poder
encontrá-lo no vocabulário grego. Trata-se da identificação de uma
dimensão nunca antes bem delineada e por isso faltam também as palavras
para exprimi-la.
O valor que a análise da
hilética pode ter para o significado mais profundo da experiência
sacro-religiosa foi por mim indicado em outros lugares (cf. Bello, 1998)
sobretudo com a finalidade de compreender o significado do sagrado nas
culturas arcaicas. De fato, o momento hilético tem um valor altamente
manifestador, ainda que não egocentrado e isso é característico
daquelas culturas em que a hilética arrasta a noética gerando uma
espécie de impessoalidade que se contrapõe, nas culturas avançadas, a
uma diversa combinação da noética e da hilética do momento
consciencial propriamente egocentrado. Tudo isto tem a ver com a mística?
Não queremos sustentar que a experiência religiosa arcaica seja mística
em sentido pleno, mas o fato que algumas afinidades existam pode ser, de
alguma maneira, evidenciado. E elas são encontradas justamente no papel
desempenhado pela hilética nas duas experiências (11).
A noética fenomenológica
Repensando nas afirmações
contidas no final do §85 de Ideen I, agora citado:
As considerações e
análises fenomenológicas, dirigidas especialmente ao elemento
material, podem ser nomeadas hilético-fenomenológicas, como, por
outro lado, aquelas relativas aos momentos noéticos,
noético-fenomenológicas. As análises incomparável-mente mais
importantes e mais ricas estão na parte noética (Husserl,
1913/1976, p.194),
compreende-se que, no interior da
duplicidade dos dois momentos, a escolha de Husserl vai para a dimensão
noética. Por outro lado, é uma escolha cultural, que se insere em uma
tradição, sobretudo a ocidental, na qual a atenção é voltada ao
momento noético, largamente espiritual. O encontro-choque entre culturas
em sentido diacrônico e sincrônico acontece, em última análise, no
terreno da peculiar dosagem dos dois momentos. O desenvolvimento da
noética é constatável no desenvolvimento do pensamento argumentativo e
predomínio do momento consciencial egocentrado.
No §86, que é dirigido a
indagar sobre os problemas funcionais, sublinha-se que
"função" tem um significado particularíssimo, enquanto tem a
sua essência na noése. Os problemas funcionais referem-se à maneira com
que
as noéses, animando o
elemento material e entrelaçando-se em sínteses e continuidades
múltiplo-unitárias, dão lugar à consciência de algo de modo que
em tal consciência concordemente possa "anunciar-se",
"demonstrar-se" e determinar-se "racionalmente"
a unidade da objetividade (Idem);
em outras palavras, a
consciência, como consciência de algo, contém em si o sentido da alma,
do espírito, da razão e então de todas as operações conexas. Trata-se
do estudo da fenomenologia de cada região ou categoria que permite
compreender as possibilidades essenciais relativas às intuições
simples, às formações cogitativas na sua gradualidade, clareza ou
confusão, expressas ou não, pré-científicas ou científicas "até
às máximas formações da ciência rigorosamente teorética e de cada
cultura" (Husserl, 1913/1976, p.195).
O momento noético, enquanto
momento estrutural de atribuição de sentido está presente em cada
cultura, mas o desenvolvimento do pensamento teorético, crítico e
construtivo, egocentrado, caracteriza particularmente a cultura ocidental,
na dupla vertente filosófica e científica.
A questão da teologia segundo
Edith Stein
O pensamento teológico na
cultura ocidental nasce fortemente entrelaçado ao filosófico. Neste
sentido é expressão de uma atividade noética levada às extremas
conseqüências.
Por outro lado, porém, a
teologia é uma reflexão movida por uma potente experiência, a que
supera e abrange todas as outras, a experiência religiosa, reforçada
pela Revelação. Mas "teologia" pode ter também um outro
sentido; de fato, Edith Stein ao comentar, no seu texto Wege der
Gottserkenntnis (12), os grandes da
teologia assim como são propostos por Dionísio o Aeropagita na sua
Teologia Mística, dá, em primeiro lugar, uma definição do que o
autor entende por "teologia": não se trata de uma ciência ou
de um estudo sistemático, como será teorizada e praticada por São
Tomás de Aquino, ou como foi indicado acima quando se estabeleceu uma
estreita conexão com a filosofia. Para Dionísio, "teologia"
indica a própria palavra de Deus, Cristo é o sumo teólogo, Deus é o
Teólogo primordial originário e são teólogos os que são por ele
inspirados, aqueles por meio dos quais Deus fala. As diversas teologias
são, na realidade, os diversos modos de falar de Deus.
Todavia Stein oscila entre os
dois significados de teologia. Ela repropõe a visão tradicional quando
delineia a tripartição entre teologia afirmativa, teologia negativa e
teologia mística, em parte reconstruída a partir das obras Dionísio, Instituições
Teológicas e Nomes Divinos, em parte elaborada seguindo São
Tomás. A definição de teologia afirmativa inclui a analogia entis,
a de teologia negativa refere-se à relação entre similitudo e
dissimilitudo. Essas "caem juntas diante do cume da ‘teologia
mística’, onde o próprio Deus revela seus mistérios, mas ao mesmo
tempo faz perceber a impenetrabilidade de sues mistérios" (Stein,
1946/1983, p.138).
Em todo caso, no texto analisado,
a atenção de Stein não é atraída pela teologia negativa ou pela
teologia mística que passa através da primeira, nas pela teologia
simbólica como o primeiro degrau da teologia afirmativa. E trata-se de um
degrau indispensável porque "Se a parte da alma que é livre da
necessidade de receber impressões sensíveis poderia estar destinada à
simples contemplação interior das imagens divinas, à outra, porém,
sujeita às impressões, convém ser elevada às coisas divinas mediante
típicas metáforas" (Idem, p.139). E algumas figuras são
privilegiadas: a do fogo, ligada aos anjos, a da taça preparada pela
Sabedoria; fala-se, além disso, da "embriaguez" de Deus, do
"sono" e do "despertar" de Deus. Portanto a linguagem
simbólica toma suas expressões do âmbito da experiência interna e
externa e os nomes usados para indicar algo de diverso do que é familiar,
remetem a algo de outro, o divino, exatamente. Uma análise hilética
desta lógica simbólica poderia ser extremamente eficaz, mas o que me
parece mais importante frisar é o caminho que vai desde a teologia
negativa à teologia mística.
Poderia parecer estranho que em
sua indagação Stein não se detenha nem sobre uma nem sobre outra, mas
que analise mais a teologia simbólica como primeiro degrau da teologia
afirmativa. Tudo isso, porém, deriva de sua perspectiva filosófica de
fundo: a razão humana tem suas capacidades e potencialidades que devem
ser desenvolvidas e pode dar uma contribuição válida ao conhecimento de
Deus; neste sentido ela se encontra perfeitamente em consonância com o
pensamento tomista. A razão, todavia, não pode penetrar no mistério,
tem necessidade de ser de algum modo completada ou superada, em primeiro
lugar pela fé que é um conhecimento obscuro para o intelecto e em
segundo lugar pela mística, a qual tem, pelo contrário, um
extraordinário poder revelador, prefigurando até mesmo a visão
beatífica (13).
A teologia negativa neste
contexto tem uma dúplice função: de fato, pode ser paradoxalmente lida
de modo positivo em dois sentidos: em primeiro lugar porque coloca em
relevo que onde há a maior dessemelhança, então entre ser humano e
Deus, há também uma similitude e portanto algo se pode apreender; em
segundo lugar porque a teologia negativa é uma via de elevação em
direção a Deus, um procedimento de ascensão que começa de baixo,
abrindo caminho à teologia mística. Esta última, por outro lado,
deveria ser chamada, seguindo a intenção de Dionísio e então o
significado de teologia como palavra de Deus, "revelação
secreta", não uma reflexão sobre mística, mas uma revelação em
ato, que pode ser estudada através da análise fenomenológica, como a
que foi conduzida por Stein no seu comentário ao Castelo Interior
de Santa Teresa D´Ávila e às obras de São João da Cruz (14).
Em última instância, a
negatividade tem a função de abrir a estrada para uma experiência mais
alta na qual o ser humano é envolvido de um modo extraordinário com toda
a sua pessoa, em primeira pessoa, mas não movendo a partir da sua pessoa,
não de modo egocêntrico. Por esta razão gostaria de mostrar como uma
fenomenologia hilética possa ser um válido instrumento interpretativo da
mística.
Hilética fenomenológica e
mística
Começo esta discussão por um
ponto extremamente importante do texto Wege der Gotteserkenntis, o
que se refere à experiência sobrenatural de Deus e em particular a
relação entre revelação e inspiração. O momento fundamental de tal
experiência é que se trata de uma certeza interior segundo a qual Deus
mesmo fala. "Tal certeza pode apoiar-se no ‘sentir’ a presença
de Deus; sente-se tocados por ele no íntimo. Eis o que chamamos de
experiência de Deus no sentido próprio e que é centro de toda
experiência mística: o encontro com Deus de pessoa para pessoa"
(Stein, 1946/1983, p.164). A experiência sobrenatural de Deus é distinta
seja da fé seja do conhecimento intelectual, os quais se apresentam
sempre como mediações; em termos fenomenológicos se poderia frisar que
nestes casos prevalece o momento noético, importante mas privado de uma
originária apreensão cognoscitiva. A distinção entre os dois momentos
é assim teorizada por Stein:
Quanto a estas
revelações, nas quais não se revela um Deus pessoal, mas somente
uma única verdade ou também um único acontecimento, acessível ao
conhecimento racional, a experiência pessoal cognoscitiva tem o
caráter de imediatismo, entendida no sentido de poder chamar
imediata a presença da realidade em comparação ao que se apreende
somente junto com os seus efeitos ou o que é tornado presente
através dos seus mensageiros. Mas Deus "não é visto
imediatamente" como um objeto que cai sob os nossos sentidos ou
como conhecido pelo espírito por intuição (Idem, p.168).
Imediatismo e mediação têm
aqui o caráter de hilética e noética não no sentido que uma possa
radicalmente dispensar a outra, mas no sentido que são diferentes os
pesos de uma e de outra. No primeiro caso, a hilética exercita uma
função atrativa e de manifestação extraordinárias, a presença é
vivida como uma Potência, para usar a linguagem de van der Leeuw
(1933/1992), que preenche totalmente, imediatamente e existencialmente
envolvendo todo o ser humano, o qual, neste caso, é de-centrado, não
egocentrado.
Este envolvimento pode ser
estudado a parte subiecti, por isso todas as observações feitas
acima sobre hilética encontram correspondência exata. O conhecimento de
Deus é, como se disse, um "sentir": acontece através de
caminhos não racionais e é o mais alto que o ser humano possa atingir.
Poder-se-ia encontrar uma afinidade com a teologia negativa, na medida em
que esta última ressalta a incapacidade da mente humana de atingir a Deus
com as próprias forças; todavia uma profunda diferença entre as duas se
refere justamente à modalidade de "sentir" que se apresenta
como um fato totalmente "positivo" e que leva a mente humana
mesma a dar-se conta de não poder sozinha atingir uma tal experiência,
mas ao mesmo tempo a torna cônscia do extraordinário envolvimento e
apreensão do ser humano. Portanto, a palavra deve ser deixada aos
místicos e às suas descrições.
Trata-se, na realidade, de um
caminho e de uma ascese. Sigamos o comentário que Edith Stein nos propõe
através de uma série de exemplificações presentes nos textos de São
João da Cruz e de Teresa d´Ávila.
A autora dedica numerosas
páginas a uma análise que busca apreender a peculiaridade da
experiência mística e distingui-la da experiência religiosa tomada na
sua generalidade e até mesmo da experiência de fé. Ao descrever esta
última, ela exprime-se assim: "O conteúdo da fé nos fornece o
material para a meditação: atividade das potências da alma centrada
sobre o que temos acolhido na qualidade de crentes" (Stein,
1950/1960, p.204); mas o que segue é particularmente significativo: Stein
nos diz, de fato, que tal conteúdo o representamos presente
através de imagens, refletimos mediante a razão e
decidimos conseqüentemente através da vontade. Esta postura,
noética e ego-centrada é acompanhada por uma componente hilética que
pode ser bem compreendida do ponto de vista da pesquisa conduzida acima;
pode-se constatar, de fato, que "a alma, a este ponto, permanece na
presença de Deus, em uma posição de relaxamento calmo e repousante,
tranqüilo e afetuoso, voltada àquele Deus que aprendeu a conhecer
mediante a fé" (Idem).
Trata-se de uma contemplação
adquirida, que é, sim, um devoto e amoroso adentrar-se em Deus, mas a
contemplação da qual fala São João da Cruz é algo bem
diferente; Deus pode conceder um obscuro e amoroso conhecimento de si sem
passar através da fé, pode infundir a contemplação. Certamente
a fé prepara a alma, como demonstram os santos carmelitas. Porém, indo
além da observação de Stein, sabemos que a mística está presente em
diversos contextos religiosos não somente cristãos e talvez a
experiência mística possa acontecer também a quem não vive uma postura
religiosa. Todavia, tudo isso poderia ser justificado por algum aceno
feito pela autora particularmente quando sublinha fortemente que a
iniciativa pertence a Deus, que se trata de uma particular apreensão:
A sua novidade – escreve
Stein – está em sentir-se tomado por Deus presente de maneira
sensível, ou então – durante aquela tremenda experiência que é
a Noite Escura, na qual a alma se sente derrubada por tal
presença – na dolorosa ferida de amor, no pungente desejo que
fica na alma quando Deus se subtrai dela. Ambas são experiências
místicas, fundadas sobre aquelas peculiares inabitações que
constituem um contato de pessoa a pessoa no íntimo da alma. A fé,
ao invés, e com ela tudo o que faz parte da vida de fé, se
fundamente na inabitação por via da graça (Idem, p.205).
A experiência mística é,
então, uma experiência de-centrada em relação ao eu; trata-se de uma
manifestação – mas também de uma apreensão – que preenche com uma presença,
por isso o ser humano é envolvido na totalidade da sua pessoa, ou ainda
mais, privilegiada nesta direção é mesmo a esfera da sensibilidade.
Trata-se de uma presença sensível ou e uma privação
sensível; enquanto "a fé é algo que se refere ao
intelecto", "a contemplação, ao invés, é algo do coração,
ou seja, do íntimo da alma, e implica então todas as faculdades"
(Idem, p.206). E a presença é acompanhada pelas sensações interiores
de felicidade ou de pungente nostalgia. Neste ponto, o intelecto e a
vontade, "ficam olhando", não são ativos, são exatamente,
tomados; a presença arrebata e acende de amor penetrando, segundo a
descrição de Santa Teresa d´Ávila, no centro do "castelo"
que é como o coração do palmeira andalusa, o íntimo centro onde a alma
está verdadeiramente em casa. Sendo que tanto na fé quanto na
contemplação a alma é alvo da iniciativa de Deus, a aceitação da
Revelação acontece por obra do intelecto e da vontade, "na
contemplação, ao invés, a alma encontra o próprio Deus que a
arrebata" (Idem).
A experiência religiosa, mesmo a
de fé, em relação à experiência mística é somente um conato. O
momento hilético é sempre presente, mesmo na experiência religiosa, por
se tratar sempre de uma espécie de manifestação da Potência e do
Estranho, como se exprime van der Leeuw. Todavia é o ser humano que busca
potência e a encontra, onde os verbos "buscar" e
"encontrar" indicam uma espécie de tomada de posse por parte do
ser humano; pelo contrário, na experiência mística o realizar-se deste
buscar e encontrar se dá verdadeiramente no ser tomado.
Procedendo à análise dos textos
de São João da Cruz que, com sua força poética, conseguem exprimir de
modo direto todo o arco das reações interiores, Edith Stein insiste
justamente nos diversos níveis de envolvimento do ser humano.
Particularmente em Chama viva de amor ela traça uma série de
"sensações" da alma: "O Espírito Santo provoca nela um
abrasamento amoroso, pelo qual a vontade da alma vem a fundir-se em um
amor só com a chama divina" (Idem, p.270). A chama toca e fere,
e no centro mais profundo da alma cumpre uma ação substancial e
prazerosíssima que é um prenúncio da visão beatífica.
É verdade que a alma pode
agir somente através dos sentidos corpóreos; mas neste estágio
ela é completamente libertada de sua escravidão, [...]. De modo
que todos os movimentos da alma são divinos, são atos de Deus,
ainda que permanecendo sempre atos da alma (Idem).
Pensemos na escultura de Bernini
figurando o êxtase de Santa Teresa d´Ávila e o modo com que ele
conseguiu exprimir essa situação de ser tomada e raptada envolvendo toda
a pessoa pela qual, mesmo na passividade, os sentidos participam da
união. E tal união é reveladora da própria natureza de Deus: de fato,
toca-se com a mão que Deus é uno e trino. Comentando a seguinte estrofe
(citada por Stein, 1950/1960, p.216)
- Ó doce incenso! Ó interna
- Chaga por mim apreciada!
- Ó branda mão! Ó toque
delicado
- Com sabor de vida eterna,
- Redime qualquer partida!
- Morte em vida, matando, tu
mudastes.
Edith Stein sugere que o
mistério trinitário é revelado não através de uma reflexão racional,
a qual, por outro lado, não poderia ter sucesso na compreensão daquela
realidade, mas através de um contato direto: através da cauterização,
da mão e da carícia que são respectivamente o Espírito
Santo, o Pai e o Filho. Não se exprime por metáforas ou símbolos:
aquelas são presenças reais e ações reais "...todas
as três Pessoas divinas se instalam na alma" (Idem, p.217). Isso
provoca um extraordinário deleite que na experiência narrada pelos
místicos permanece predominantemente no interior da alma, mas "Em
certos casos – comenta E. Stein – a ferida interna se manifesta
também no exterior, no corpo. João re-evoca os estigmas de São
Francisco..." (Idem, p. 219).
Se até mesmo a fé é um fato
intelectual, no sentido que envolve o ser humano fazendo apelo também à
sua inteligência e vontade ainda que iluminando de modo extraordinário e
elevando-as, a teologia, na sua vertente positiva e negativa, representa
também sempre uma tomada de posição humana. Se refletirmos, então,
sobre as Vias do conhecimento de Deus, seguindo as indicações de
Stein, notamos todsas elas sendo exploras para apreender o valor essencial
de cada uma. Se a teologia positiva cumpre um papel importante na sua
interpretação não podemos sub-valorizar o papel da teologia negativa
que consiste em desembaraçar o intelecto de falsas imagens e abrir,
então, a via a um contato direto e essencial com Deus.
A experiência mística, pelo
contrário, é caracterizada pela absoluta manifestação, pela absoluta
iniciativa de Deus, que penetra no ser humano transformando-o, dilatando
seus limites, fazendo apreender diretamente e sem medições a sua
presença. A dimensão noética e a hilética, ainda que correlativas,
são ativadas de modos diversos, fornecendo também êxitos diversos às
questões das Vias para o conhecimento de
Deus.
Referências bibliográficas
Ales
Bello, A. (1999). L´incarnazione nella prospettiva della Hyletica
fenomenologica. In M. M. Olivetti (textes réunis par). Incarnation.
(pp. 105-113). Padova: Biblioteca dell’Arquivio di Filosofia / CEDAM.
Ales
Bello, A. (2001). Teologia filosofica e Hyletica fenomenologica:
intersoggettività e impersonalità. In M. M. Olivetti (textes réunis
par). Intersubjectivité et théologie philosophique. (pp.263-277).
Padova: Biblioteca dell’Arquivio di Filosofia / CEDAM.
Bello, A. A. (1998). Culturas e Religiões: uma leitura
fenomenológica. (A. Angonese, Trad.). Bauru - SP: Edusc. (Original
publicado em 1997).
Husserl,
E. (1976). Idee per una fenomenologia pura e per una filosofia
fenomenologica; a cura di E. Filippini. (G. Alliney, E. Filippini,
Trad.s). Torino: Einaudi. 2v. (Originais publicados em 1913 e 1952).
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L. (1922). La mentalité primitive. Paris: Presses Universitaires
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Stein,
E. (1960). Scientia Crucis: studio su S. Giovanni della Croce.
(Edoardo di S. Teresa, Trad.). Milano: Àncora. (Original publicado em
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Stein,
E. (1962). Endliches und Ewiges Sein: Versuch eines Aufstiegs zum Sinn
des Seins. Edith Steins Werke; herausgegeben von Lucy Gelber, Romaeus
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(Suor Giovanna della Croce o.c.d., Trad.). Padova: Ed. Messaggero.
(Original publicado em 1946).
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E. (1999). Natura, persona, mistica: per una ricerca cristiana della
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van
der Leeuw, G. (1992). Fenomenologia della religione. (L. Conte,
Trad.). Torino: Bollati Boringhieri. (Original publicado em 1933).
Notas
(1) Artigo
traduzido do italiano por Miguel Mahfoud, com revisão de Marina Massimi. Volta
(2) Husserliana,
Bd. III. Volta
(3) Husserliana,
Bd. IV. Volta
(4) Ideen II,
§39 (Husserl, 1952/1976). Volta
(5) "In
alle reale Apperzeptionen, in die der Weltlichkeit, geht sie ein als
vermittelnd, als die jewiligie Apperzeption der kinästhetischen Situation
in ihrem Horizont vermöglicher Wandlungen, in welcher hyletisch
konstituiertes Seiendes allzeit sein eigenes Sein hat und es nur haben
kann, das Sein des im Modus infolge mit motivierten ‘Nachsatzes’ der
auf dem vertrauten Wege kinästhetischen Vermöglichkeit und der vertruten
Weise, wie sich abhebendes Hyletisches mit den vermöglichkeit und der
vertrauten ‘Nachsatzes’ der auf dem vertrauten Wege kinästhetischen
Vermöglichkeit und der vertrauten miwandelt und seine optimale Gestalt
immer wieder zeigt bei der vermöglich wiederhergestellten selben
Situation identifizierbarer ‘Nachsätze’ " (p.23). Volta
(6) "Urströmendes
und urkonstituierendes Nicht-Ich ist das hyletische Universum in sich
lonstituirende und stets schon konstituiert habende, ein
zeitigend-zeirliches Urgeschehen, das nicht aus Quelles des Ich, das also
ohne Ichbeteiligung statt hat; aber das Ich ist immer ‘dabei’, in der
Wachleit als affiziertes der abgehobenheiten und als immer irgendewie
actives" (p.25). Volta
(7) Der Aufbau
der menschlichen Person. Edith Steins Werke, Bd. XVI. (cf. Stein,
2000). Volta
(8) Ideen II,
§39 (Husserl, 1952/1976). Volta
(9) Der Aufbau
der menschlichen Person. Edith Steins Werke, Bd. XVI. (cf. Stein,
2000). Volta
(10) Ideen II,
§39 (Husserl, 1952/1976). Volta
(11) O
pensamento primitivo é considerado "místico" pela primeira vez
por L. Lévy-Bruhl (1922) sobretudo em La mentalité primitive, mas
é G. van der Leeuw (1933/1992) que colhe precisamente o significado desta
definição em Lévy-Bruhl ligando-a à lógica da participação (cf.
§75), da qual o pensador francês havia falado a propósito dos
primitivos. Todavia, van der Leeuw considera que seja melhor usar o termo
mística para indicar a peculiar situação de quem "não tem
necessidade de rito algum, de nenhum costume, de nenhuma figura: não
fala, não dá mais nome e não deseja mais recebê-lo; quer somente ‘permanecer
mudo frente ao que não tem mais nome’ " (Idem, p. 383). O vínculo
entre as duas posições poderia ser reconduzido à "presença do
sagrado" que opera um arrastamento e uma apreensão explicável
somente com o predomínio do momento hilético, mas van der Leeuw tem
razão quando ressalta que na postura arcaica a resposta está em uma
ação ritual que é estranha ao místico. Uma ulterior diferença pode
ser encontrada na referência subjetivo-pessoal no caso da mística, ou
então impessoal, como é encontrável na visão do mundo arcaica,
conforme procurei colocar em evidência nos ensaios citados no início do
presente artigo (cf. Ales Bello, 1999 e 2001). Volta
(12) O texto
encontra-se em Stein, E. (1993). Erkenntnis und Glaube. Edith Steins
Werke; herausgegeben von Lucy Gelber, Romaeus Leuven. Freiburg:
Herder. Tradução italiana: Stein, E. (1983) Vie della conoscenza di
Dio; intr. di C. Bettinelli (Suor Giovanna della Croce o.c.d., trad.).
Padova: Ed. Messaggero. (Original publicado em 1946). Volta
(13) Em muitos
lugares ela trata deste assunto. Veja-se em particular Endliches und
Ewiges Sein em Edith Steins Werke, Bd. II, I, §4, Sinn und
Möglichkeit einer "Christlichen Philosophie". (Stein,
1952/1962). Volta
(14) Confira Die
Seelenbur em Edith Steins Werke, Bd.VI, traduzido para o
italiano como Il Castello interiore em Natura, persona, mistica
(Stein, 1936/1999).
Confira também Stein, E. (1950).
Kreuzeswissenschaft. Studie iiber Joannes a Cruce. Edith Steins Werke,
Bd. I; herausgegeben von L. Gelber, Romaeus Leuven. Louvain:
Nauwelaerts. Traduzido para o italiano: Stein, E. (1960). Scientia
Crucis: studio su S. Giovanni della Croce. (Edoardo di S. Teresa,
trad.) Milano: Àncora. Volta
Nota sobre a autora
Angela Ales Bello é professora
de História da Filosofia Contemporânea na Pontificia Università
Lateranense, Roma, Italia. Dirige o Centro Italiano di Ricerche
Fenomenologiche, filiado ao The World Phenomenology Institute (EUA).
È diretora da revista Aquinas e colabora com Recherches
Husserliennes e Studien zur interkulturellen Philosophie. Contatos:
Pontificia
Università Lateranense, Facoltà di Filosofia, Piazza San Giovanni in
Laterano n.4, Città del Vaticano (00120).