Este Grupo de Pesquisa tem como proposta realizar investigações e discussões que congreguem duas vertentes do campo da História: a História Digital e a História Pública. Ambas as vertentes têm implicações de natureza interdisciplinar e vêm ganhando cada vez mais importância e legitimidade no campo da história ao longo dos últimos anos do século XX e nas primeiras décadas do século XXI, por razões epistemológicas, políticas e sociais.
“Dizer que a tecnologia está em todo lugar”, já se tornou lugar-comum, como afirma Anita Lucchesi (2014). É patente e crescente a percepção de que a revolução tecnológica em curso transforma cotidianamente todos os aspectos da vida humana, em graus diferentes e relacionados às desigualdades sociais e regionais. Mesmo sem cair na falácia de considerar o acesso à internet igualitário e neutro, como alertou Carlo Ginsburg em 2010, pode-se afirmar que, presentemente, a celeridade das mudanças de suporte, o barateamento de sistemas e o advento da internet móvel permitiram uma revolução nas comunicações, a partir da qual os internautas não iriam apenas receber passivamente conteúdos, como no rádio e na televisão, “mas poderiam interagir tanto com os produtores de conteúdo quanto uns com os outros.” (Andrade, 2022, p.191)
A História e o ofício do historiador também foram modificados pela perspectiva digital, tanto no que se refere ao alargamento do público produtor e consumidor de conhecimento quanto aos espaços que podem ocupar. A História Digital, nessa perspectiva, é um braço das chamadas Humanidades Digitais, que se ocupa de compreender as experiências humanas no tempo, considerando seja as fontes digitais (natas digitais ou digitalizadas), seja a relação entre humanos e tecnologias. Por ter suas especificidades em métodos e fontes, não se ocupa apenas das novas ferramentas digitais, que facilitam as práticas tradicionais da pesquisa histórica. Trata-se também do desenvolvimento de uma relação estreita com as tecnologias e a presença pulverizada de passado e memórias, capazes de modificar os próprios parâmetros da pesquisa, como esclarece Noiret (2015).
O autor ainda considera que a História Digital, confrontada no ambiente virtual, acaba por construir uma noção de digital public history, considerando que há a construção de um público maior e mais participativo nas formas de apreensão das interpretações do passado. Um público possivelmente mediado pela ação do historiador profissional, mas também permeável às novíssimas formas de narrativas do passado, produzidas por diferentes usuários e produtores de conteúdo nas mídias digitais.
A história pública, embora muito relacionada ao mundo digital contemporaneamente, não pode ser reduzida a este aspecto, devendo ser pensada em sua historicidade e amplitude. Em Estados Unidos e Europa, o termo surgiu na década de 1970 num esforço de ampliação da esfera de atuação de historiadores e de alcance do fazer histórico. Santhiago (2016) destaca que as iniciativas de história pública no Brasil não são realmente contemporâneas, sequer novas, mas sim respostas às demandas sociais por história e memória. É importante ponderar, no entanto, que não se trata de “dar um nome novo a uma velha prática”, mas de reconhecê-las como a emergência de uma nova perspectiva de análise da produção histórica e como uma atitude crítica diante do passado, presente e futuro.
No Brasil, a construção do que se vem chamando história pública, com este nome, teve início na década de 2010 e tem especificidades, principalmente em comparação à trajetória nos EUA:
“aqui [no Brasil], a história pública canaliza e amplifica debates sobre a relevância e o papel social da história, do historiador, do ensino e das instituições de história, memória e patrimônio. (…) Quando orientada à regeneração de um diálogo cultural amplo, que assume o público como o espaço comum no qual interpretações da história são circuladas e negociadas, a história pública se realiza como um gesto repetido de não pactuação.” (SANTHIAGO, 2019, p.154)
Observa-se, na proposição de um “movimento” de história pública no Brasil, uma especificidade do papel de historiadores: reconhecer a legitimidade e as especificidades de narrativas sobre a história, produzidas por diferentes sujeitos e instituições, com o objetivo de dialogar com elas, compreendê-las, analisar os usos que fazem da história e das temporalidades e problematizá-las junto aos diferentes públicos pelos quais circulam. A dinâmica que se tem observado, portanto, na história pública feita por historiadores, no Brasil, é a do reconhecimento de que a cultura de história produz-se no diálogo entre “autoridades compartilhadas” por diferentes sujeitos, cada qual com seus objetivos e papéis sociais.
O Grupo de Pesquisa que ora se propõe, vinculado ao Laboratório de História do Tempo Presente – LHTP da Fafich/UFMG e derivado de grupo de estudos em atuação, tem como principal objetivo atuar na interseção entre essas duas tendências: História Digital e Pública – em consonância com a consideração de Roy Rosenzweig e Daniel Cohen (2022) sobre como o ambiente digital pode representar um alargamento das possibilidades de participação da sociedade, em geral, nos projetos de História.
No encontro entre a prática da história pública e a História Digital, observa-se um alargamento da noção e reconhecimento dos lugares/espaços produtores, divulgadores e de circulação do conhecimento histórico: academia, escola, museu, teatro, propaganda e também as mídias, das mais clássicas – como o jornal, rádio e TV – às novíssimas relacionadas à informática e à web. Este encontro tem promovido uma grande transformação nas formas de interação entre os diferentes “regimes historiográficos” (Nicollazi, 2019) na contemporaneidade.
O Grupo de Pesquisa História Digital e Pública, composto por historiadores que pesquisam diferentes temporalidades e temáticas, em diálogo com a bibliografia acadêmica de referência e com o “movimento” de história pública, propõe-se a: produzir projetos de pesquisa, individuais e coletivos, e desenvolvê-los em ambiente de debate; construir metodologias de trabalho relacionadas ao ensino de História e à divulgação histórica; promover interações com outros departamentos, institutos e centros da UFMG, bem como de outras universidades nacionais e internacionais, atento à natureza interdisciplinar de sua atuação; buscar diálogo com públicos diversos, produtores e consumidores da História, promovendo reflexões sobre os usos e abusos da história e das temporalidades.
OBJETIVO GERAL
Realizar pesquisas e discussões, acadêmicas e sociais, localizadas na interseção entre a História Digital e história pública.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
- Realizar pesquisas sobre a ampliação do acesso às fontes (digitalizadas ou natas digitais) e as novas possibilidades de produção e circulação de narrativas sobre experiências históricas de outros tempos;
- Construir metodologias para a produção de ambientes e objetos digitais voltados para o ensino de História e a divulgação histórica;
- Promover debates acadêmicos e sociais sobre a produção e a circulação de narrativas históricas, em diálogo com os campos do Ensino da História, da Divulgação Histórica, do Patrimônio Cultural e da Comunicação Pública;
- Estreitar o diálogo com o instrumental da Ciência da Computação na coleta e no tratamento de dados sobre a produção de narrativas históricas e os usos do passado nas mídias digitais;
- Estabelecer vínculos com departamentos e institutos da UFMG, e com outras instituições acadêmicas e de pesquisa nacionais e internacionais.
LINHAS DE PESQUISA
- Ferramentas, Métodos e Recursos Digitais para a História
- Ensino de História, Ambientes e Objetos Digitais
- Usos do Passado, Memória Pública, História Oral
- Museus, Arquivos e Centros Patrimoniais
- Divulgação Histórica, Comunicação Pública e Mídias Digitais
INTEGRANTES
Coordenadoras:
Miriam Hermeto Sá Motta – Departamento de História/PPGHIS – Fafich/UFMG

Doutora em História (2010), mestre em Educação (2002), licenciada (1997) e bacharel em História (1994), realizou toda a formação superior na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professora associada do Departamento de História e docente permanente do Programa de Pós-Graduação em História (linha de pesquisa História e Culturas Políticas) da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (FAFICH/UFMG). Coordenadora do Laboratório de História do Tempo Presente (LHTP) da FAFICH/UFMG. Atua principalmente nas áreas de História do Brasil República e Ensino de História, com abordagens de história pública e história oral.
Regina Helena Alves da Silva – Departamento de História/PPGHIS – Fafich/UFMG

Graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (1980), graduação em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (1982), mestrado em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (1991) e doutorado em História Social pela Universidade de São Paulo (1997). Pós doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela UFBA (2009) na área de Planejamento Urbano e Regional. Pós doutorado em Cidades e Culturas Urbanas pelo Centro de Estudos Sociais – CES – da Universidade de Coimbra, na área de Visões Contemporâneas: Urbanismo, Territorialidade e Espaço Público. Professora Associada IV da Universidade Federal de Minas Gerais, atua nos programas de pós-graduação em História e em Comunicação Social. Tem experiência: na área de História, com ênfase em História Social da Cultura, atuando principalmente nas áreas de culturas urbanas, história da cidade e do urbanismo, práticas culturais, memória e patrimônio; em Comunicação Social, atuando principalmente nas áreas de práticas sociais, comunicação e culturas contemporâneas, tecnologias da informação e comunicação, conformações contemporâneas dos movimentos sociais e redes sócio-técnicas. Coordenou vários estudos e pesquisas nas áreas de Urbanismo, Territórios Urbanos, Espaços Digitais, Letramento e Inclusão Digital em Escolas, Participação Popular, etc. Coordenadora do Centro de Convergência de Novas Mídias – CCNM-UFMG, foi colaboradora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para a Web – INWEB. Atualmente é vice-coordenadora do INCT de Politicas Publicas e Desenvolvimento Territorial (INPUT).
Pesquisadores:
André Luan Nunes Macedo – PPGHIS – Fafich/UFMG; UEMG

Possui graduação e mestrado em História pela Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ) e doutorado pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Atualmente, é Professor Substituto de História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Tem interesse nos seguintes temas: inteligência artificial e ensino de história, livros didáticos, história política e América Latina.
Beatriz Silveira Reis – Historiadora no Laboratório de História do Tempo Presente/Fafich

Graduada em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (2023) e pós-graduanda em História e Práticas Docentes no CEFET-MG. É professora de História e pesquisadora do período da Ditadura Militar brasileira. Atua como historiadora no Laboratório de História do Tempo Presente da UFMG desde 2024.
Elisa Melo Brochado Santos Carvalho – Professora na Rede Particular de Educação Básica

Licenciada em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (2022), é professora da disciplina na educação básica. Está interessada em temas referentes ao Ensino de História, História da Historiografia, História das(os) Intelectuais e História da Educação.
Igor Giovanni Murta de Sousa – PPGHIS – Fafich/UFMG

Mestrando em História Social da Cultura pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais sendo bolsista da CAPES. Graduado em Licenciatura e Bacharelado pela mesma universidade. Atua na pesquisa em História Digital, com ênfase nas representações da História e Historiografia através dos jogos digitais.
Nathalia Guimarães e Sousa – PPGHIS – Fafich/UFMG

Doutoranda em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na área de concentração em História, Tradição e Modernidade: Política, Cultura e Trabalho, na linha de pesquisa em História e Culturas Políticas. Mestra em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), na área de concentração em História, Cultura e Poder, na linha de pesquisa em Poder, Mercado e Trabalho. Graduada em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Bolsista PROEX/CAPES. Atualmente é integrande do grupo de pesquisa e extensão “História Intelectual: narrativas, práticas e circulação de ideias” (UFMG). Tem experiência na área de História, atuando principalmente nos seguintes temas: História Intelectual e dos Intelectuais, História do Tempo Presente, História do Brasil República, Direitas Contemporâneas, História Digital e Pública, História e Música, Cultura e Política.
Raquel Silveira Martins – UFOP; Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais/SEEMG

Doutoranda em História e Mestre em Educação pela Universidade Federal de Ouro Preto sendo bolsista da CAPES/CNPq. Graduada em História pela mesma universidade, onde atuou como bolsista em Projetos da Pró-Reitoria de Extensão voltados para a Educação de Jovens e Adultos, com foco tanto na alfabetização quanto na elaboração de material didático. Foi educadora social no Projovem Urbano em Divinopolis/MG e professora na Universidade do Estado de Minas Gerais/Unidade Divinópolis, trabalhando junto ao curso de História nas disciplinas relacionadas à Educação. Professora efetiva de História na rede estadual de ensino de Minas Gerais. Atualmente pesquisa sobre História dos Intelectuais, História Pública e História do Tempo Presente.
Valdeci da Silva Cunha – UFMG; Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais/SEEMG

Doutor em História Social da Cultura pela Universidade Federal de Minas Gerais (2019), pela linha de pesquisa História Social da Cultura, sob a orientação da professora Regina Helena Alves da Silva. Mestre em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (2012), pela linha de pesquisa História e Culturas Políticas, sob orientação da Profa. Dra. Kátia Gerab Baggio. Licenciado em História, pela mesma instituição (2008). Bolsista de iniciação à pesquisa (Cnpq) pelo projeto Coleção Brasiliana: leituras e narrativas da nação (1931-41). Foi bolsista da Fundação Mendes Pimentel (FUMP) no projeto História Social da Linguagem, sob orientação do Prof. Luiz Arnaut. Atualmente, é professor de História da Educação Básica (Ensino Fundamental) da Rede Municipal de Contagem. Atua principalmente com estudos sobre história do Brasil republicano com ênfase em história, sociabilidades e memórias intelectuais, história e culturas políticas, história e literatura, história e cidades. Atualmente, atua como professor de História da rede pública de ensino do estado de Minas Gerais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, D. A. Redes sociais digitais: um novo horizonte de pesquisas para a História do tempo presente. In.: BARROS, José D’Assunção. História Digital: A Historiografia diante dos recursos e demandas de um novo tempo. Petrópolis/RJ: Editora Vozes, 2022.
LUCCHESI, A. Conversas na ante-sala da Academia: o presente, a oralidade e a História Pública Digital. História Oral, [S. l.], v. 17, n. 1, p. 39–69, 2014. Disponível em: https://revista.historiaoral.org.br/index.php/rho/article/view/341. Acesso em: 11 jun. 2024.
NICOLAZZI, Fernando. Os historiadores e seus públicos: regimes historiográficos, recepção da história e história pública. Revista História Hoje, 8(15), 2019, 203–222. Disponível em: https://rhhj.anpuh.org/RHHJ/article/view/525. Acesso em: 12 jun. 2024. https://doi.org/10.20949/rhhj.v8i15.525
NOIRET, S. História Pública Digital │ Digital Public History. Liinc em Revista, [S. l.], v. 11, n. 1, 2015. DOI: 10.18617/liinc.v11i1.797. Disponível em: https://revista.ibict.br/liinc/article/view/3634.. Acesso em: 11 jun. 2024.
SANTHIAGO, R. Servir bem para servir sempre? Técnica, mercado e o ensino de história pública. Revista História Hoje, [S. l.], v. 8, n. 15, p. 135–157, 2019. DOI: 10.20949/rhhj.v8i15.533. Disponível em: https://rhhj.emnuvens.com.br/RHHJ/article/view/533. Acesso em: 11 jun. 2024.ROSENZWEIG, R.; COHEN, D. In.: ROSENZWEIG, R. Clio Conectada: o futuro do passado na Era Digital. Trad. Gil Reyes. Belo Horizonte/MG: Editora Autêntica. 2022.
