Registro do congresso do Diretório Nacional dos Estudantes (DNE), realizado em Curitiba/Paraná em 1966. O líder estudantil Paulo Gouvêa aparece ao lado esquerdo do ministro da Educação do governo Castello Branco, Raymundo Moniz Aragão (em pé). Fonte: Zero Hora.
Entre os documentos guardados pelo NARA e agora disponibilizados aqui no site do LHTP da UFMG, estão registros de conversas, seminários e outras informações recolhidas pelo corpo diplomático dos Estados Unidos no Brasil sobre lideranças estudantis de direita durante a década de 1960. Essa documentação possui grande valor qualitativo, pois indica um movimento estudantil mais heterogêneo e dividido do que muitas vezes supomos. Ela também nos ajuda a compreender a complexidade das políticas da ditadura militar voltadas à juventude universitária, que combinaram medidas repressivas com iniciativas para estimular a atuação política tutelada.
A preocupação de autoridades norte-americanas em formar lideranças estudantis brasileiras afinadas aos valores do chamado “mundo ocidental” precedia a instauração da ditadura. Ao menos desde os anos 1950, no contexto da Guerra Fria, a Associação Universitária Interamericana (AUI) levava cerca de 80 estudantes por ano para passar uma temporada nos Estados Unidos em seu programa de viagens. Mas esses esforços ganharam novos sentidos após o golpe de 1964. O corpo diplomático norte-americano buscou apoiar as lideranças favoráveis ao seu país e à ditadura, mantendo contato direto com jovens que participavam de entidades estudantis criadas pelo regime pós-1964.
O governo do marechal Castello Branco, por sua vez, adotou política internacional de alinhamento aos EUA e política interna de apoio às correntes de direita do movimento estudantil. A ditadura criou uma estrutura de representação estudantil alternativa à União Nacional dos Estudantes (UNE) e às Uniões Estaduais dos Estudantes (UEEs), vistas como “instrumentos de subversão”. A intenção era estimular a atuação daqueles jovens que seriam “democratas”, “verdadeiros estudantes”. O Diretório Nacional dos Estudantes (DNE) e as suas seções estaduais foram regulamentados pela Lei Suplicy de Lacerda, de novembro de 1964. Seções da entidade foram criadas por universitários que apoiavam o regime em diferentes estados do país, com atuação mais significativa em Pernambuco e no Rio Grande do Sul.
Em termos quantitativos, a política da ditadura no sentido de promover o movimento estudantil de direita foi um fracasso. Na documentação disponível no NARA, os líderes estudantis brasileiros relatam ao pessoal norte-americano a dificuldade em se aproximar dos estudantes adotando uma postura favorável ao regime militar. Eles também reclamam da falta de apoio do próprio MEC, já que o DNE não era um consenso dentro do ministério. Em outros documentos, são reportadas derrotas políticas das chapas ditas “democráticas” em eleições estudantis. De curta duração, as entidades criadas pela Lei Suplicy foram extintas em fevereiro de 1967 pelo decreto Aragão.
Clique aqui e acesse mais documentos do Acervo documental dos Arquivos Nacionais e Administração de Documentos (National Archives and Records Administration – NARA).
Gabriel Amato Bruno de Lima
Professor no IFSULDEMINAS – campus avançado Três Corações
Doutorando em História na UFMG e pesquisador do LHTP/UFMG