CORPO E PSIQUISMO
Introdução à filosofia de Descartes
   
Desenvolvido por: João Gabriel A. Domingos
  José Cândido L. Ferreira
  Luiz Felipe S. Campos

Laboratório de Filosofia I - UFMG - 2° Semestre de 2007


[ Início ] [ Anterior ] [ Próximo ]


Resumo das seis aulas:

Optamos por fazer um recorte do tópico “Ser Humano: Corpo e Psiquismo” da Proposta Curricular. Ou seja, ao invés de trabalhar com todo o conteúdo proposto, o que daria uma vantagem quantitativa, preferimos trabalhar apenas com alguns tópicos e autores, optando pela vantagem qualitativa. O foco é prioritariamente os principais conceitos e argumentos das Meditações Metafísicas de Descartes que dizem respeito à questão “Ser Humano: Corpo e Psiquismo”. O objetivo central é “discutir a idéia da primazia da consciência” (Versão Preliminar da Proposta Curricular) para a constituição do ser humano. Sem grandes aprofundamentos e apenas na etapa de conclusão, trabalharemos com a crítica direcionada a esse filósofo (Nietzsche).

 

As aulas serão divididas em seis etapas:

1.ETAPA LÚDICA;

2.ETAPA HISTÓRICA;

3.ETAPA DE PROBLEMATIZAÇÃO;

4.ETAPA DE CONCEITUAÇÃO;

5.ETAPA DE ARGUMENTAÇÃO;

6.ETAPA CRÍTICA;

 

Bibliografia:
Descartes, R. Meditações Metafísicas. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Coleção Os Pensadores)

Albuquerque, M. Se eu fosse Sherlock Holmes” Histórias de detetive. São Paulo: Ática, 1992. (Coleção Para gostar de ler, número 12)

Marcondes, D. Iniciação à História da Filosofia – dos Pré-Socráticos a Wittgenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. (2ª edição)

 

 

  ETAPA LÚDICA – Primeira aula: Leitura de texto literário

 

OBJETIVO: construir uma imagem a partir de um texto literário e trabalhá-la analogicamente durante toda a exposição do tema filosófico. O objetivo é totalmente didático: criar uma referência atraente e leve para que a partir dela os alunos se sintam a vontade para entrar na reflexão filosófica. Trata-se de um pequeno conto policial em que o protagonista tem a tarefa de descobrir o autor de um crime. O objetivo do professor é desenhar a imagem de um detetive, destacando as principais características de um INVESTIGADOR.

 

TEXTO: “Se eu fosse Sherlock Holmes”, José Joaquim Medeiros e Albuquerque (Para Gostar de Ler – Volume 12, Histórias de Detetive)

 

Sinopse: fascinado com as histórias de Conan Doyle, o protagonista procura a situação na qual, através de raciocínios lógicos e da consideração do contexto, ele poderá desvendar um crime. Um roubo de uma jóia durante uma festa é a situação perfeita para ele exercer o seu papel de detetive.

 

FILÓSOFO = INVESTIGADOR

 

“Parece-me que deles [dos romances de Conan Doyle] se concluía que tudo estava em prestar atenção aos fatos mínimos. Destes, por uma série de raciocínios lógicos, era sempre possível subir até o autor do crime.”

 

CONDUÇÃO DA AULA:

-Leitura do texto (20min).

-Selecionar as principais características de um investigador: atividade conjunta com os alunos anotando no quadro (10min).

-Atividade para o portifólio “Faça um pequeno texto caracterizando um investigador. Diga o que caracteriza um investigador” (20min).

 

DESCRIÇÃO DA ATIVIDADE DO INVESTIGADOR:

A atividade do investigador consiste no trabalho de buscar elementos, por mínimos que sejam, que indiquem um caminho para chegar até um fim esperado que, na maioria das vezes, é um autor de um crime. E, de fato, esses elementos, ou pistas (como comumente ouvimos falar), são mínimos; impressões digitais, fios de cabelo, boatos e qualquer outro tipo de informação. Muitas vezes algumas pistas levam o investigador a seguir caminhos muito difíceis e que podem levá-lo  para muito longe do caminho que deveria seguir. Mesmo assim o investigador não pode parar sua busca, não pode descartar nenhuma pista, deve considerar as que são menos evidentes, desconfiar de seus companheiros e de qualquer possível suspeito.

Esta é uma atividade que pode transitar muito facilmente entre um ceticismo forte, uma dúvida geral, e um dogmatismo também forte, uma crença no que aparece mais imediato. Tanto a dúvida quanto a crença podem atrapalhar o trabalho de investigação, mas como são posições inevitáveis, é preciso haver um senso crítico, uma mediação, que tenda a considerar, de forma bem medida, todas as pistas e possibilidades que surgirem no decorrer do trabalho.

 

 

  ETAPA HISTÓRICA - Segunda aula: A inauguração do pensamento moderno

 

OBJETIVOS: situar historicamente a filosofia de Descartes. Expor as suas motivações. A sua postura em relação à filosofia escolástica e à ciência de sua época. Apresentar a filosofia de Descartes em um contexto de crise cultural e, sobretudo, crise da forma como o homem elabora a visão sobre si mesmo. Trata-se de um contexto de ruptura cultural, em que ao mesmo tempo em que uma cultura antiga reclama a sua vigência, uma nova cultura parece despontar por todos os lados.

 

CONDUÇÃO DA AULA:

-Exposição (30min).

-Atividade para o portifólio: “Descreva os acontecimentos que tornaram o período no qual Descartes viveu (1596-1650) como um período de crise” (20min).

 

INTRODUÇÃO DA EXPOSIÇÃO HISTÓRICA:

Não apenas Descartes tem uma posição ambígua em relação à cultura de seu tempo, mas essa cultura também é ambígua: por um lado, uma tradição querendo preservar-se, por outro, uma nova visão do mundo que parece escapar por todos os lados. E a filosofia de Descartes não deixa de manifestar essa ambigüidade, simultaneamente revolucionária e conservadora. Ao mesmo tempo que era preciso recusar todo conhecimento inseguro, a existência de Deus deve permanecer, como conclusão, indubitável.

De qualquer modo, nós veremos, o modernismo de sua filosofia foi o de instaurar uma base segura para o conhecimento e para o estar no mundo do homem no próprio Eu, autônomo em relação ao dogmatismo da tradição, ainda que seja dependente de Deus. A subjetividade é o princípio do conhecimento e da relação do homem com o mundo e mesmo o corpo aparece como alteridade submetida a este Eu que é somente “uma coisa pensante e inextensa”. Apenas em uma época na qual a cultura é passível de ser colocada em dúvida, alguém poderia pensar que a realidade está fundada no Eu, na subjetividade. O cogito é o conceito central para entender a concepção cartesiana do ser humano.

 

CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL:

No plano religioso, a reforma protestante e a contra-reforma.

No plano científico, Galileu Galilei, Kepler, Copérnico e Giodarno Bruno: um novo posicionamento científico diante dos fenômenos (e a repressão decorrente de seus novos posicionamentos).

No plano econômico-político, o despontar de uma nova economia mercantilista associada às grandes navegações e a descoberta da América e a decadência do modo de produção feudal.

 

ANALOGIA COM O INVESTIGADOR:

Tal como um Sherlock Holmes, Descartes procurar a verdade, ao risco de encontrar “o criminoso na família da própria vítima”, porém a sua verdade nunca abalaria o suficiente os poderes estabelecidos. Ao longo das Meditações, Descartes não cansa de reconciliar ciência, religião e investigação filosófica, mesmo que tenha como objetivo recusar um conjunto de saberes anterior a ele. A posição de Descartes é tão ambígua quanto a de um investigador.

 

 

  ETAPA DE PROBLEMATIZAÇÃO – Terceira aula: Problematização a partir das Meditações Metafísicas

 

OBJETIVO: Desenvolver uma problemática a partir da exposição da dúvida metódica (hiperbólica), tendo em vista que a dúvida é o momento propriamente problemático do texto cartesiano.

 

CONDUÇÃO DA AULA:

- Exposição (30min).

- Exercício do portifólio: “Por que Descartes pretende duvidar de todas as coisas?” (20min).

-

Exposição da dúvida metódica como momento problemático (30min).

 

Exposição da dúvida metódica como momento problemático:

-  Expor a função da dúvida. Qual é o método através do qual Descartes pretende encontrar o fundamento da realidade das coisas e, em seguida, do seu conhecimento? A dúvida metódica.

-  Argumento dos Sentidos: os sentidos me enganaram uma vez, logo eu devo recusa-los como base segura para o conhecimento das coisas. Mas, ainda assim, eu devo aceitar a existência das coisas materiais.

-  Argumento dos Sonhos: porém, nada me garante de que eu não estou sonhando e que as coisas que me aparecem, como existentes, não são meros frutos da minha imaginação. Então, não posso garantir que elas, de fato, existam, porque posso estar sonhando. No entanto, mesmo em sonho, não é possível que eu negue as verdades matemáticas.

- Argumento do Gênio Maligno: porém, não tenho meios de saber se não estou sendo objeto das brincadeiras de um gênio maligno que me engana até mesmo em relação às certezas matemáticas e me faz errar todas as vezes que busco conhecer algo.

-  Sendo assim, eu não tenho nenhuma garantia de nada acerca da realidade. Não há nada que me garanta a realidade das coisas. O que escapa a toda dúvida? O que resta depois dessa radicalização da dúvida que não pode ser colocado em dúvida? O que me garante a realidade das coisas? 

 

Utilização da imagem do INVESTIGADOR para explicar a função da dúvida:

Assim como o investigador, o filósofo precisa encontrar o método através do qual ele pode ter a garantia de que o seu conhecimento é verdadeiro. No conto, o autor elabora um plano (leva todos os convidados da festa para um quarto e faz perguntas) cujo objetivo é criar uma situação em que seja possível descobrir o crime sem erro. Da mesma forma, Descartes também elabora “um plano”: duvida de tudo para saber o que resta após essa dúvida. A dúvida, então, é um artifício para encontrar aquilo que não pode ser colocado em dúvida tal como levar um convidado de cada vez para o quarto e interroga-los foi o plano do investigador do conto para saber quem era o criminoso.

 

 

  ETAPA DE CONCEITUAÇÃO – Quarta aula: Leitura de trechos das  Meditações

 

CONDUÇÃO DA AULA:

- Aula expositiva com leitura conjunta dos fragmentos do texto Meditações Metafísicas, selecionando os principais conceitos (30min).

- Atividade para o portifólio: “liste os principais conceitos de Descartes e defina-os”. (20min).

 

Conceitos ou noções importantes para a concepção cartesiana do homem:

Deus, alma, corpo, pensamento, sensação, idéias, erro, causalidade, dúvida, duvidar, método, razão, ciências, opinião, razão, estar consciente, ser iludido, ilusão, iludir-se, domínio de si, domínio da razão... 

 

* Baixe os fragmentos das Meditações em formato ou

 

 

  ETAPA DE ARGUMENTAÇÃO – Quinta aula: Exposição dos argumentos

 

CONDUÇÃO DA AULA:

- Aula expositiva: “argumento do cogito e prova da existência de Deus” (30min).

- Atividade para o portifólio: “reproduza o argumento do cogito e os argumentos sobre a distinção entre corpo e alma (coisa pensante e coisa material)” (20min).

-Argumento do cogito: tudo pode ser passível de dúvida, sobre todas as coisas o gênio maligno pode me enganar, menos que eu duvido, logo eu existo, porque só algo que existe é capaz de pensar. Mas disso eu deduzo apenas que sou só pensamento, sou uma coisa pensante e não extensa.

-Distinção entre res congitans e res extensa: existe uma coisa pensante e uma coisa material. (parágrafos 9–18, 2ª Meditação; parágrafo17-18, 6ª Meditação).

 

 

  CONCLUSÃO Sexta aula

 

OBJETIVO: desenvolver sem grandes aprofundamentos uma crítica à filosofia cartesiana (utilizando Nietzsche).

 

Dentro do arcabouço conceitual das Meditações, a consciência tem primazia na constituição do ser humano, ela é a substância sobre a qual é possível deduzir todas as outras coisas, sem contar que ela tem uma relação privilegiada com Deus, que é o criador e quem conserva todas as coisas, até mesmo a consciência.

 

Nietzsche (Além do Bem e do Mal): dessubstancialização da consciência através de uma crítica que tende a pensá-la como uma faculdade para a defesa da sobrevivência biológica (naturalização da consciência). Isso prepara uma crítica moral à subjetividade como substância (a alma, o eu, a consciência...).

 

* Baixe os trechos dos Aforismos 3 e 16 em formato ou

 

CONDUÇÃO DA AULA:

- Aula expositiva: Críticas – sem aprofundamentos – à concepção cartesiana de homem – Nietzsche (30min).

- Atividade para o portifólio: (a) Você acha interessante a concepção de homem de Descartes? O que sim? O que não?; (b) A concepção de homem de Descartes diz alguma coisa para você ou não faz o mínimo sentido?; (c) Você acha importante pensar o que é o homem? Por que?; (d) Há alguma característica importante do ser humano que Descartes não leva em consideração, mas você julga importante? (20min).

 

Avaliação - Prova escrita:

Perguntas (responder apenas uma e é permitida a consulta ao texto de Descartes):

 

1)Formule com suas próprias palavras o argumento do cogito. Você considera esse argumento bem sucedido? Justifique sua resposta.

 

2)Qual o papel do “sujeito pensante” na filosofia de Descartes?

 

3)A filosofia de Descartes pode ser tomada também como uma certa perspectiva da relação do homem com o mundo. Explique com suas palavras a principal característica dessa perspectiva.

 

Avaliação: Prova escrita ou Portifólio

Critérios de avaliação:

 

1)Referência ao conteúdo trabalhado em sala de aula;

 

2)Criatividade no modo de lidar com o conteúdo (utilização de exemplos, associações pertinentes, inclusão de outros conteúdos filosóficos trabalhados anteriormente, etc.);

 

Além das atividades direcionadas ao portifólio que deverão ser feitas em cada aula, também será acrescentado a ele, anotações, pontos que o aluno julgar relevantes, etc. Tudo isso seria incluído em uma “parte livre” do portifólio.